O Globo, 05/03/2004
Written by urbe, Posted in Imprensa
Matéria sobre música feita com Gameboy que escrevi para o Rio Fanzine (O Globo).
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No jogo da música
Bruno Natal ESPECIAL PARA O RIO FANZINE
Transformar um Game Boy em um sintetizador e seqüenciador, fazendo do brinquedo uma fábrica de beats, sons, ruídos e experiências sonoras em 8 bits. Essa era a proposta do duo Monoaural, formado por Berna Ceppas e Kassin, ontem, na apresentação na Casa da Gávea.
Na mesa dos produtores, em vez de toca-discos, samplers e i-books, havia um teclado Micro Korg, dois pedais de delay e dois Game Boys plugados numa mesa de quatro canais. Cada um dos aparelhos estava rodando um cartucho diferente: Berna “jogava” Nanoloop e Kassin “brincava” de Little Sound DJ.
Utilizar o Game Boy para fazer música faz todo o sentido, afinal, todos blips, clics e tóins já estão lá dentro. O cartucho funciona como um jogo normal, mas ao invés de desenharem personagem e obstáculos na tela, exploram as possibilidades sonoras do vídeo game. O Little Sound DJ vem com samples de bateria, como o pancadão 808, favorita dos bailes funk.
A dupla descobriu a novidade, por caminhos diferentes, há mais de um ano. Depois, conversando, descobriram que estavam pesquisando a mesma coisa paralelamente. Apesar de Berna ter utilizado o aparelho ano passado no Rio Sesc Experimental, esse provavelmente foi o primeiro show totalmente feito com Game Boy no Brasil.
A apresentação, improvisada em cima de alguma poucas bases pré-gravadas, começou ensurdecedora. As batidas quebradas predominaram, numa espécie de colisão eletro-Miami bass. Uma das bases esbarrarou no house, enquanto algumas outras poderiam ajudar o funk carioca a dar (mais) um passo a frente ou servir de cama para o hip hop.
O experimentalismo deu lugar ao (nem tão) pop quando Kassin utilizou um vocoder enquanto fazia interferências oitentistas no teclado. Surtiu efeito. Teve um lá que não agüentou e foi dançar na frente da mesa. A pedrada foi a única que não foi feita de véspera. Composta por Kassin durante uma viagem, deve fazer parte de um disco só de Game Boy, “Artificial”, a ser lançado ainda este semestre pelo selo da dupla, o Ping Pong.
Os programas utilizados pelo Monoaural foram feitos por alemães, mas antes disso a própria Nintendo já havia produzido um jogo sonoro para o Game Boy. Foi um fracasso. Saiu de linha e hoje é item de colecionador. Os próprios Nanoloop e Little Sound DJ já se tornaram cult. O primeiro foi descontinuado e o segundo teve a produção suspensa, talvez porque estejam trabalhando em uma nova versão. O fato é que seus cartuchos estão custando absurdos 799 euros, dez vezes mais caro do que na época do lançamento.
Na rede dá pra achar emuladores de Game Boy e seus respectivos roms (como são chamadas as cópias digitais dos jogos), inclusive os desses sintetizadores, que rodam em qualquer PC. Pra quem quer tocar no próprio aparelho, o caminho é mais difícil. É necessário adquirir um aparelho como o Emerger, espécie de gravador de cartuchos virgens.
O Micro Music é uma boa fonte para se aprofundar no assunto. Lá dá inclusive para ouvir algumas produções feitas utilizando a traquitana. Gostou? Tenta a sorte.