quarta-feira

30

abril 2008

2

COMMENTS

Onda

Written by , Posted in Música, Resenhas

É sempre uma grata surpresa quando o show de abertura é melhor que a atração principal. Quando isso não se deve ao fato da estrela da noite ser uma decepção, mas por méritos próprios do convidado, é ótimo. Se você nunca tiver escutado o artista antes, melhor ainda.

Essas três coisas aconteceram ontem, no Scala, em Londres, quando a sueca Lykke Li tocou antes do francês Sebastien Tellier (e antes dos dois, com a casa praticamente vazia, Bridgette Amofah)

Mesmo que parte gráfica do seu lançamento mais recente, “Sexuality”, entregasse a cafonice bem humorada do trabalho, as credenciais do Sebasiten Tellier — disco produzido por Guy-Manuel de Homem-Christo (Daft Punk), elogios de Nicolas Godin (Air) — não davam a dica do que estava por vir.

Para construir um Sebastien Tellier brasileiro, seria preciso imaginar o João Brasil, preso no corpo do Paulo César Peréio, tocando o repertório de uma parceria imaginária entre Fausto Fawcett e Reginaldo Rossi. Ou algo assim.

Dançando totalmente desajeitado, o sujeito fez amor com o piano, com o pedestal do microfone, com a guitarra, se apalpou como se fosse o Michael Jackon, ignorou os pedidos para que falasse em inglês e fez piadas em francês, para alegria dos seus muitos conterrâneos presentes e se esbaldou no temas soft-porn, revezando-se entre o piano e a guitarra, com direito a solo de metal.

É até difícil não se distrair com o personagem criado por Tellier, totalmente embuído do tema do seu disco, levando a canastrice ao limite. Prestando atenção a parte musical, percebe-se que a piada tem conteúdo. O recheio é de boas melodias, teclados oitentistas, ecos de Jean Michel Jarre e instrumentos bem tocados por uma bom trio de apoio (baixo no sintetizador, bateria repleta de pads eletrônicos e teclados).

Divertido e engraçado, sem ser engraçadinho.

A loucura orgasmástica promovida por Sebastien Tellier não parece, nem de longe, relacionada com o nome escolhido para tocar antes dele. A atitude, cada um a seu modo, talvez seja o elo entre os dois.

Com disco produzido por Björn (do Peter, Björn and John) e tocando pelo mundo com Shout out Louds e El Perro del Mar, aos 22 anos a sueca está enturmada na cena de seu país. Aos poucos, vai ampliando seu território, arrastando um público considerável (e atento) para quem era a banda de abertura.

Lykke Li não faz o estilo menininha-de-voz-rouca que tem inundado o mercado atualmente. Apesar de baixinha e loirinha, se coloca no palco sem se preocupar exatamente se o cabelo vai estar despenteado — não estava.

Ainda que soe minimalista em diversos momentos, o som é cheio de detalhes e nuances, com elementos de folk e eletrônica, sem ser exatamente uma mistura disso.

Ao vivo, acompanhada por bateria, guitarra e teclado, os graves ganham mais peso. Além de cantar, Lykke brinca com um kazoo, batuca em tamborim e agogôs e arrisca umas pancadas na bateria.

No show, durante as músicas do disco em que seu vocal é dobrado, ela usa trechos pré-gravados para produzir o mesmo efeito. O curioso é que, em alguns casos, ela escolhe fazer o vocal de apoio ao vivo, em vez da voz principal.

Vestida de preto e dançando de maneira desconpasada, o foco é mesmo na sua voz, doce e angelical, quase infantil. Com essa descrição, poderia ser um desastre, rapidamente desmentido por faixas como “Little bit”, “I’m good, I’m gone” ou “Dance dance dance”.

Tem tudo pra decolar e o hype em torno do seu nome parece estar apenas começando, após passagens pelo festival americano SXSW e pelo programa de TV inglês “Later… with Jools Holland”.

Até onde vai, é com ela mesmo. Como disse o Berna, ao passar a dica, “ela tem onda”.

Deixe uma resposta

2 Comments

Deixe uma resposta