quarta-feira

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maio 2012

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Entrevista – Eduardo Paes, prefeito do Rio, sobre bicicletas (parte 2/3)

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Continuando a entrevista com o prefeito Eduardo Paes sobre bicicletas (leia a intro e a primeira parte), agora falando sobre bicicletas elétricas, a geografia da cidade e urbanismo. Na quinta-feira vem a terceira e última parte, sobre as bicicletas laranjas.

(Matutando sobre as campanhas de conscientização e educação para ciclistas, motoristas e pedestres, pensei que seria legal se houvesse um selo oficial, recebido após um curso ou oficial, de repente até online, pra colar na bicicleta ou no carro e atestar que o ciclista ou motorista estão inteirados. Simbólico, claro, porém já é alguma coisa, já que não há um placa na magrela.)

URBe – Uma das coisas que está sendo dita pela comunidade de ciclistas é sobre a solução que o senhor encontrou pra legislar a bicicleta elétrica [após o incidente com o rapaz que teve a sua apreendida numa blitz da lei seca]. A primeira vista, foi algo muito positivo. Fiquei muito assustado quando aconteceu, pensei: “cara, agora vão mandar emplacar bicicleta, vai ser um desestímulo pra quem usa”. Mas a verdade é que é que existem 5 mil bicicletas elétricas na cidade contra 500 mil bicicletas tradicionais, pedaladas mesmo. E a bicicleta elétrica estar compartilhando a ciclovia é também uma questão pra muitos ciclistas e para muitos pedestres. Aquele veículo anda mais rápido que os outros e ele cai em uma legislação, em uma sombra, que é um pouco difícil de legislar. Você acha a solução que você encontrou é a melhor?

Eduardo Paes – Cara, eu acho que a situação era tão absurda, tão inusitada, tão nonsense, que eu falei: “pô…”. Enfim, a gente deu ali o limite, de até 20 km/h, mais de 16 anos de idade, deve ser considerado igual uma bicicleta. Tenho uma bicicleta elétrica, uso pouquíssimo. Ando muito mais devagar com a elétrica do que com a minha que eu pedalo. Nem acho que a elétrica seja mais rápida não, tem umas mais modernas… Mas a elétrica é mais pesada, mais difícil de levar, as outras são bem mais ágeis. A gente não deve fazer disso uma coisa burocrática. Essa é a minha cabeça. Algumas pessoas querem que eu faça um “Detranzinho” da Prefeitura. O cara vem aqui, “vamos colocar número de chassi”. Então assim, é uma doideira! O que eu quis foi simplificar, o que eu acho é que a gente precisava de uma resposta imediata pra dizer que essa cidade era amigável para bicicleta. Tava vendo ali na madrugada, tuitei na madrugada falando: “pô, vou liberar esse negócio”, porque é um absurdo! Você fica com uma discussão na cidade que é meio neurótica.

URBe – Mas não acha que isso é meio apressado? Em Nova Iorque e na Espanha, por exemplo, as motorizadas são proibidas, não são consideradas bicicletas.

Eduardo Paes – Ah, mas aí não dá pra copiar tudo. “Tudo que é bom para a América…”

URBe – É porque tem uma diferença entre as bicicletas elétricas, isso é importante marcar. Existem as bicicletas elétricas, as “mopeds”, e as eletroassistidas, as “pedelecs”. A bicicleta elétrica não depende do esforço do condutor, ela é motorizada, por isso em certos países ela é caracterizada como ciclomotor. As pedelecs são eletroassistidas: você pedala e ela te auxilia a dar força, te ajuda a manter velocidade, mas quando você chega , na maior parte dos casos, a 25 km/h, ela corta a energia e você pedala por conta própria. Essas são liberadas pra uso como se fossem bicicletas normais. Então a dúvida que eu tenho é se dá pra simplificar tudo.

Eduardo Paes – Ali a gente precisava ser radical. Mas por exemplo, essa semana já veio o presidente do Detran, acho que ontem até, o presidente do Detran, o pessoal da Secretaria de Transportes já topou o negócio do1 kilowatt, que aí eu acho que já entra nessa categoria da bicicleta [eletroassistida].

URBe – Essa categoria na verdade é definida pela mecânica da bicicleta. Também pela força e pelo modelo, que são coisas diferentes.

Eduardo Paes – Vou te falar assim, com sinceridade, acho que tem uma postura aqui, um posicionamento político, não to falando de político-eleitoral não…. Essa cidade é amigável pra esse deslocamento pela bicicleta. Ela tem que ser amigável.

URBe – Voltando pra parte do estímulo que eu falei das empresas em Londres, em Seattle existe o “Bike to Work Month” (“mês da pedalada pro trabalho”, em tradução livre), que é um evento criado pela prefeitura da cidade, um evento educacional, pra estimular as pessoas a usarem a bicicleta como transporte. Você pensa em fazer coisas assim?

Eduardo Paes – Mas então, a gente tem o “Dia Mundial Sem Carro”.

URBe – Mas é diferente, né?

Eduardo Paes – Enfim, é diferent,e né, não to falando que é a mesma coisa, mas é uma coisa que a gente faz desde o primeiro ano de governo. Eu pessoalmente ia de bicicleta, até quando tava mais fora de forma, eu ia morrendo mas ia de bicicleta. Então é isso, pra mim quanto mais campanha, melhor. Acho que agora teve uma campanha que foi a melhor de todas. Essa história [das bicicletas elétricas] acabou acontecendo e esse negócio acabou sendo uma coisa que chamou a atenção pra esse tema e estimula as pessoas a usarem.

URBe – Meu medo é isso ser resolvido com uma certa pressa. Concordo que devia ser uma resposta ágil, mas eu acho que a situação é um pouco mais complicada. Porque, novamente, como não existem as vias pré-estabelecidas, não se pode usar o asfalto e as soluções vão se sobrepondo, talvez virem novos problemas. Existe um projeto chamado “Cidade para Pessoas”, em que uma menina foi viajar o mundo atrás de lugares que valorizam a pessoa mais que o meio de transporte. A cidade que a gente vive hoje em dia, você mesmo estava falando sobre isso no início, é feita pro carro, não para as pessoas. Todo investimento é feito para valorizar os carros. Acho que talvez o erro esteja aí.

Eduardo Paes – Totalmente.

URBe – Então, tirar uma pista do Jardim Botânico, será que isso é ruim? Ou será que isso vai fazer mais gente andar de bicicleta, porque a via vai estar engarrafada? Porque a gente vai ficando sufocado na cidade, sem ter o que fazer. Nesse projeto, em Copenhague, ela levantou um número muito interessante: a prefeitura colocou todas as variáveis em um equação e chegou a conclusão que pra cada quilômetro pedalado, a cidade ganha R$ 0,40. Ou seja, deixa de gastar R$ 0,40.

Eduardo Paes – Vou te falar, a vida do Prefeito aqui ia ficar muito bem se todo mundo andasse de bicicleta (risos)…

URBe – E pra cada quilômetro percorrido por um carro a cidade perde R$ 0,20, com custos de manutenção das pistas, acidentes, tudo que acontece. Não é o caso de fazer um estudo sério, amplo, aprofundado, pra ver quanto isso economicamente não pode ser vantajoso pra cidade?

Eduardo Paes – Eu diria que nem precisaria fazer um estudo. É óbvio que seria fantástico. Isso que você tem aí, do custo pra cidade, os investimentos em ruas… Por isso que quando as pessoas dizem “vamos alargar aqui!”, não adianta! Tem que investir em transporte de alta capacidade. De novo: em nenhuma cidade que ela visitou ela tinha a alternativa da bicicleta como transporte de alta capacidade. A gente nunca pode confundir isso.

URBe – Mas não é o volume da pessoa andando que vai transformar em alta capacidade?

Eduardo Paes – Não, não, porque assim…

URBe Em Copenhague são mais de 50% das pessoas que vão de bicicleta para o trabalho.

Eduardo Paes – O Reino da Dinamarca é diferente da maioria das cidades (risos). Eu conheço bem Copenhague, eu estive lá…. o Reino da Dinamarca é diferente. Nem sei quantas pessoas tem em Copenhague. Mas Copenhague tem sistema de transporte muito eficaz. As pessoas nas distâncias maiores não vão de bicicleta. Você pode ter áreas da cidade em que o deslocamento…. Zona Sul. O sujeito vai de Copacabana, Gávea, Ipanema, tem até bastante ciclovia. Você pode fazer esse deslocamento. Sub-bairros de Campo Grande com o centro de Campo Grande. Mas pro grande deslocamento da cidade, a bicicleta nunca será um meio de transporte de alta capacidade.

O transporte de alta capacidade não é que muita gente anda, mas sim o que leva muita gente. Muita gente anda de carro mas isso não quer dizer que ele seja de alta capacidade. Então é isso. A gente precisa de transporte de alta capacidade para a solução, mas é obvio, quanto mais deslocamento… Carro é o pior inimigo da cidade. Grandes distâncias é o pior inimigo de uma cidade. Por exemplo, você é morador na Zona Sul. A Zona Sul topa ser mais adensada do que ela já é? Que a solução pra você evitar deslocamento é adensar mais. O que é adensar mais? Mais gabarito, mais ocupação, será que topam? Não topam. Então você tem que construir pra classe média mais alta uma Barra da Tijuca. Você vai ocupando mais território. Porque a gente faz um projeto de revitalização da Zona Portuária? É pra isso: pra você não ficar indo em direção ao oeste sempre.

O Rio é uma cidade que fugiu de si própria, ao longo da sua história. Quando a gente faz o projeto de revitalização da Zona Portuária, e desculpa fugir um pouco do assunto, mas também estamos falando de urbanismo, a gente tá querendo dizer o seguinte: a gente quer que essa cidade abandonada, não seja consolidada. É uma absurdo a gente ter uma área de 5 milhões de metros quadrados no centro do Rio de Janeiro, com um lugar cheio de galpão largado, velho. Então vamos fazer residência, prédio, escritório aqui, que é pras pessoas voltarem. Aí você tem a solução, aí você vai permitir o uso de bicicleta. O cara que, por exemplo, vai morar na Francisco Bicalho e trabalha na Cinelândia. Esse cara vai poder andar de bike ou vai poder pegar um VLT. Então é isso: os pequenos deslocamentos servem nessa direção.

É um pouco a discussão do urbanismo. O que a gente quer? A gente quer uma cidade que cresce, que se amplie sempre? Quanto mais eu tenho território, mais eu aumento os custos, mais eu tenho que ter o carro da Comlurb, tenho que ter mais Guarda Municipal, eu tenho que ter mais lâmpada, eu vou ter que tapar mais buraco, vou ter que ter mais polícia… Então essa é uma visão moderna, mais recente de cidade, que é o seguinte: “não pode adensar, espalha!” e agora a visão do mundo é assim “pera aí, concentra.” A Zona Sul é muito restritiva, muito refratária a qualquer tipo de adensamento, um pouco daquela lógica “quem tá dentro, tá dentro e quem tá fora não entra mais”.

URBe – É bastante adensado, né.

Eduardo Paes – Então, é isso que eu tô te dizendo, não tem que ser mais adensado. Por isso que a gente tem que construir a Barra da Tijuca.

URBe – Então pensando na Zona Portuária, e ainda desviando de assunto, você não acha que teria que se pensar em um projeto além do que já ta sendo pensado pro porto? Novos bairros mesmo. Por exemplo, as pessoas procurando seu primeiro apartamento pra morar e tal… Se você construísse, como acontece organicamente em outros países, os jovens começam a ir pra zonas mais depredadas, que é mais barato, daí vêm os artistas, acaba gerando interesse, aí vem as pessoas com dinheiro e revitalizam [num processo de gentrificação]. O leste de Londres, onde irão acontecer as Olimpíadas era assim até outro dia.

Eduardo Paes – Não. Onde é o Parque Olímpico não era isso não.

URBe – Em Hackney?

Eduardo Paes – Onde é o Parque Olímpico foi uma das zonas mais degradadas lá.

URBe – É isso que estou falando!

Eduardo Paes – Não foi o processo mais natural, né.

URBeFoi um processo de gentrificação né, era barato, ficou caro…

Eduardo Paes – Mas aí foi um ativismo estatal que levou para lá o Parque Olímpico.

URBe – Mas antes do Parque Olímpico tiveram as pessoas que foram pra lá e fizeram dali um bairro e aquilo acabou acontecendo. Você não pensa em alguma coisa assim pra Zona Portuária?

Eduardo Paes – Totalmente, ué.

URBe – Não pensar apenas, pelo menos pelo que leio, em empresas vindo pra cá….

Eduardo Paes – Não, não, o primeiro empreendimento é a Vila de Mídia, que é só residencial.

URBe – Bares, casas de shows, coisas que mostrem pras pessoas que é interessante morar ali?

Eduardo Paes – Exatamente, ali é só isso, tem muita residência… Pelo contrário.

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