Esse ano a cobertura do Coachella (a sétima!) foi um pouco diferente dos outro anos. Em vez de relatar em tempo real no Instagrame Twitter do URBe, escrever uma crítica para algum veículo impresso, seguido por um longo relato aqui no blog, fui convidado pela Farm para cobrir ao vivo para o blog da marca carioca, o adoro! Farm, através do Stories da marca.
Abaixo reproduzo o post pós-Coachella que escrevi pra eles.
Como complemento, de 2006 pra cá, a grande diferença esse ano foi a grande quantidade de shows assistidos nos palcos abertos e pouquíssimos nas tendas. Isso tanto tem a ver com uma mudança na pegada da curadoria do festival (as apostas normalmente feitas nas tendas mais longe do meu gosto pessoal), quanto pelo fato de uma geração inteira de bandas surgidas na segunda metade dos anos 2000 terem se consolidado, crescido e estarem agora nos espaços maiores. E tendo sido também a primeira vez no segundo final de semana, talvez pelo clima extremamente seco, o gramado estava bem castigado.
O anúncio da escalação do Coachella é uma das mais aguardadas do calendário mundial de festivais. Ainda que seja impossível agradar todas as expectativas, sempre altíssima, todos os anos a lista de artistas está caprichadíssima, dando oportunidade de conferir o que algumas das mais promissoras novidades, e também nomes já estabelecidos, andam fazendo.
Com uma oferta tão grande do que assistir, é fácil bater o desespero de não poder conferir tudo. Normal. O que pode ser ainda pior é de fato tentar ver tudo. Ainda que em alguns casos valha a pena pular de um show pro outro, ver um pedacinho de um show aqui, outro ali, é muito mais importante conseguir abstrair do que está perdendo e focar noque está vendo. As vezes um show inesperado está tão bom que vale mais a pena conferir inteiro do que tentar correr pra ver o finalzinho daquela banda imperdível. Numa escalação dessas, conseguir decidir o que não ver é a verdadeira tarefa.
E assim, no segundo dia, após o o transe eletrônico do Floating Points, os shows do Car Seat Headrest e Chicano Batman foram substituídos por uma visita à instalação “Chrysalis” com projeção de 360 graus e uma volta na roda gigante, respectivamente. A obra de arte mais comentada esse ano foi “The Lamp Beside The Golden Door“, do brasileiro Gustavo Prado, uma torre de espelhos côncavos e convexos que gerava um efeito espetacular.
Sem problemas, porque logo na sequência o Thundercat veio sacudindo tudo com seu free jazz pop (pode isso?) enlouquecedor. Conhecido pelos muito remixes que tocam em quase todas as festas, o Mura Masa fez um ótimo show, bem dançante, logo antes do Bon Iver ninar a plateia no palco principal.
Nas tendas ao lado, os fãs de música eletrônica se dividiam entre idolatrar Nicolas Jaar e pular com o DJ Snake. No palco principal, Lady Gaga reuniu boa parte do público do festival pra um show que pareceu um tanto preocupado demais em agradar.
No último dia, com as energia já mais baixas e com a moleira frita do sol de 40 graus do deserto, as coisas fluíram mais devagar. O soul do Lee Fields (a caminho do Brasil) e o indie folk do Whitney sofreram com isso, já que havia pouca gente pra vê-los na hora em que tocaram.
No entardecer, Devendra Banhart (também com turnê marcada pelo Brasil) contou com o hermano Rodrigo Amarante no baixo, NAO conseguiu um dos coros maisaltos do festival com sua “Firefly” e Jack Garrat fez uma festa sozinho, tocando bateria, sintetizador, guitarra e cantando – as vezes tudo ao mesmo tempo – numa tenda.
Apontando pro final, Lorde serviu de abertura para a grande atração da noite, Kendrick Lamar. Com disco novo lançado dias antes, Kendrick mostrou porque é tido como o principal nome do rap atual, mostrando controle total do público através de suas letras poderosas.
Já era tarde da noite quando a fila de saída do estacionamento tomava mais de uma hora. Ninguém se importava. Todos riam de orelha a orelha, felizes com um dos mais divertidos finais de semana do ano. Como é todo ano.
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Co-fundador e diretor criativo do Queremos! e WeDemand, Bruno Natalé documentarista e jornalista, com mestrado em Goldsmiths,University of London. Dirigiu e produziu filmes como “Dub Echoes”,sobre a influência do dub jamaicano no surgimento do hip hop eda música eletrônica, além de ter registrado alguns dos maiores artistas brasileiros, de Chico Buarque a JotaQuest. É consultor do canal Multishow e colabora no desenvolvimento de projetos, como o Prêmio da Música Brasileira. Escreveu por 5 anos uma coluna semanal sobre música e cultura digital no jornal O Globo e edita o blog URBe há 14anos.
2015, o ano em que menos resenhei shows na vida. Foi quase tudo na base da legenda das fotos no Instagram. Faltam palavras, ficam as memórias evocadas pelas imagens.
Cada Coachella é uma história diferente e por isso é um dos festivais mais legais de se cobrir. Mais do que o ano da entressafra, o Coachella 2012 será lembrado como o ano do frio, da chuva, o Coldchella. Pela primeira vez (até onde pesquisei) choveu e o frio de 10 graus desnorteou um evento pautado, primordialmente, pelo sol. E ficou bastante claro esse ano o quanto o sol é fundamental para o festival.
Espécie de termômetro da música pop independente contemporânea (OK, ficou parecendo estatística do Zagallo: “nunca perdi pra país com a letra Z e que joga com listras vermelhas verticais”), goste ou não, através das suas escalações, apresentações e até horários, entende-se um pouco do momento pelo qual passa o cenário musical.
A julgar pelo que se viu em 2012 (e se verá novamente nesse final de semana, quando pela primeira vez o Coachella terá um segundo final de semana, espelhando as atrações do primeiro) o momento atual é de entressafra. A escalação trouxe as tradicionais reuniões de bandas extintas (At The Drive In, Mazzy Star), nomes grandes pra chamar público (Dr. Dre & Snoop, Radiohead) e muitas, mas muitas bandas novatas.
O que não se vê, ao menos não em números expressivos, são aquelas bandas recém-estouradas, equilbrando-se entre um público médio, quase chegando no grande. Não faz sentido escalar novamente a última leva a conseguir fazer essa transição de pequeno para médio porte (MGMT, Hot Chip, Vampire Weekend, 2ManyDJs/Soulwax, Chromeo, etc), porém, não há novos postulantes a esse posto. Com isso, foram muitas apostas, algumas das quais podem voltar ao festival em outras condições.
Isso não deixa de ser totalmente alinhado como espírito do Coachella, mesmo que hoje ele tenha se tornado muito maior. É muito bom que não haja um desespero pelo sucesso (mesmo porque, hoje os ingressos esgotam antes da divulgacão da escalação) e se repeite o tempo das coisas. Mérito da curadoria. O fato de a atração mais comentada ter sido um holograma diz muito sobre isso.
Resta ao público garimpar, é esse interesse que move o festival. Ainda que em alguns casos o hype do mundo real seja mais rápido que o da rede, fazendo com que shows fiquem abarrotados no início e, de repente, esvazie, com as pessoas indo buscar outras coisas, num universo de mais de 140 atrações o que predomina é um público aberto ao novo, mesmo que para alguns isso dure apenas três dias.
Isso faz toda diferença do ponto de vista prático. Sem um público interessado cena nenhuma, de nada, se sustenta (sim, estou falando sobre o Queremos!de maneira enviezada).
Dia 1 Breakbot, Givers, James, Neon Indian, GIRLS, Arctic Monkeys, Pulp, Frank Ocean, Mazzy Star e M83
Dividido entre ver as novas instalações e correr atrás de alguma das boas atrações que ficam salpicadas no horário em que o campo de polo ainda está vazio, a entrada é sempre um momento confuso. Enquanto Breakbot fazia um set bem parecido com o que fez no Rio, tocando depois do Mayer Hawthorne The Rapture no Circo Voador (e sem banda, como era esperado), o Givers fazia um show sub-qualquer bandeca de rock. Restou passar pelo palco principal pra pegar um pouco do rapper Kendrick Lamar. Tarde demais; só deu tempo de ouvir o ele se despedindo e aturar a velharia do James enquanto almoçava.
As coisas começaram frias, no amplo sentido da palavra. Os shows não impressionavam e o frio ia piorando conforme o dia passava. Logo a previsão de 30% de chances de chuva se confirmaria, sem muita intensidade, só que as gotinhas estavam geladas que só vendo. Muita gente não levou a metereologia sério e a cena de meninas de roupa curta se encolhendo tornaram-se tão comuns quanto as alienígenas jaquetas de couro circulando pelo gramado.
GIRLS
No palco menor, o Neon Indian levou o lo-fi a extremos, mostrando um show mais sujo do que gasto pelo tempo. Mesmo com três sintetizadores, guitarra e bateria, o som saia fraco e abafado, sem empolgar a boa quantidade de gente assistindo. Melhorou um pouco nas duas últimas, os “hits” falando de uma garota polonesa e num verão caloteiro, “Polish Girl” e “Deadbeat Summer”. Bem apropriado.
Tudo prometia melhorar com o GIRLS, mostrando as músicas do excelente “Father, Son, Holy Ghost”, um salto de qualidade tremendo da banda. Só que… O que quer que tenham aprendido no estúdio, não chegou ao palco. Sem nenhum carisma, Christopher Owens teve sua voz e violão encobertos por um baixo rachando e até pelas boas cantoras de apoio. Não foi terrível, porém não chega perto do disco.
Arctic Monkeys
No palco principal, o Arctic Monkeys mostrava como é que se faz. É impressionante o quanto a banda se converteu de um bando de moleques em um grupo de rock com cancha de palco. A única vez que havia visto a macacada ao vivo foi naquele mesmo palco, em 2007, quando estavam lançando o segundo disco, ainda desconhecidos nos EUA e fazendo brincadeiras com a situação.
Com quatro discos nas costas, projetos paralelos e sabe-se lá quantas horas de palo, Alex Turner sente-se a vontade como front man. Isso é bom e ruim. Se por um lado o domínio de palco propicia um espetáculo mais controlado, é justamente esse controle que tira um pouco do frescor juvenil que foi uma parte tão importante no estouro da banda. O tempo passa, é incontrolável. O volume das guitarras não, pelo contrário, e poderiam estar um pouquinho mais altas.
O Pulp deu sequência inglesa, com um show bem produzido, cenário grandioso e Jarvis Cocker inspirado. Vista uma música e os fãs enlouquecendo, voei para conferir o Frank Ocean. Integrante mais velho do coletivo de hip hop angelino Odd Future, Frank se debruça sobre o r&b, cantando sobre relacionamentos, não sobre escatologias como os rappers do grupo.
Frank Ocean
A Gobi, menor das tendas, transbordava e foi difícil abrir caminho. Ao conseguir avistar o palco, deu pra identificar o BadBadNotGood como seus músicos de apoio, o que subiu bastante o nível (eles ainda tocaram toda as noites no acampamento).
O trio de baixo, bateria e piano canadense já vinha ciscando pela área, fazendo versões jazzísticas das músicas do Odd Future, então foi até uma junção lógica – no show a formação era guitarra, baixo, bateria e MPC/teclado (até onde deu pra ver, a ausência de uma câmera cobrindo o lado direito do palco no vídeo com a íntegra do show não ajuda a identificar).
Ao Frank Ocean restou fazer o que sabe, cantar. Bem a vontade frente a multidão, ele perdeu bastante tempo reclamando do som. O público não viu tanto problema, as meninas soltando gritinhos sem parar. Quando acabou, Mazzy Star já estava no palco menor fazia dez minutos.
Mazzy Star
A luz azul que preenchia o espaço durante quase todo o show escondia uma Hope Sandoval emburrada, quieta, sem que ela dissesse o motivo (olhando bastante para mesa de monitor, a qualidade do som devia ser a razão). O folk blues chapado, de linhas de órgão doorianas e slides viajantes, atraiu pouca gente – o frio certamente não ajudou.
Uma pena, pois o show foi bastante bom (dá pra assistir todo no YT). Mesmo eles tendo “se livrado” de “Fade Into You” lá pela metade, era um show pra ter encantado se as condições tivessem sido melhores.
A caminho do M83, o extremo oposto acontecia em uma das tendas, onde o Atari Teenage Riot rasgava os ouvidos dos poucos que se encorajaram a encarar a bagaceira. Surpresa mesmo viria a seguir.
M83
Contrariando todos os prognóstico de um show indie e cabeçudo de shoegaze eletrônico, o show do M83 é totalmente pop (assista completo no Daily Motion). Com luzes frenéticas e ênfase nas programações eletrônicas e na própria bateria (por vezes 4×4) em quase todas as músicas, a tenda lotada quicou sem parar enquanto Anthony Gonzales se deliciava, sem cansar de agradecer e fazer menção ao fato de estar sendo tão diferente de quando tocou no festival, em 2005.
A saída de um dos fundadores, o sucesso de “Hurry Up, We’re Dreaming”, o M83 está mesmo vivendo um recomeço. É como se fosse outra banda, nascida pra fazer sucesso. Não é exatamente meu tipo de som, principalmente os gritos de “mãos pra cima” ou nos momentos em que soa como se o Miike Snow (com quem guardam semelhanças, o que é bom) tocasse as músicas do Arcade Fire (o que seria ruim) Gostos a parte, é um showzão- e bombaria por aqui. Dispensável mesmo só o solo de sax no final de “Midnight City”.
Falando em Miike Snow, no dia seguinte eles tocaram e receberam a Lykke Li, assista a partir do minuto 29. De volta a sexta, a atração seguinte seria o The Horrors. O frio venceu e esse ficou pra depois, encerrando a noite mais cedo.
Dia 2 Big Pink, Jaques Lu Cont, tUnE-yArDs, Andrew Bird, Noel Gallagher’s High Flying Birds, The Shins, Feist, Flying Lotus, SBTRKT, ASAP Rocky e Radiohead
O otimismo sobre uma melhora das condições climáticas se realizou apenas parcialmente: o frio continuou, mas pelo menos não choveu, o que já ajudou bastante. O sol até ameaçou aparecer algumas vezes.
Tendo perdido os shows do Destroyer e da Azealia Banks (essa tendo utilizado metade do tempo de palco que tinha), ambos muito cedo, o dia começou com o Big Pink, aturado somente tempo suficiente para Jaques Lu Cont começar seu set na tenda Sahara.
Jaques Lu Cont
Nome por trás do Les Rythmes Digitales e produtor do “Confessions On a Dancefloor”, da Madonna, Jaque Lu Cont é o pseudônimo mais utilizado pelo inglês Stuart Price (um trocadilho anglo-franco significando algo como Jack O Cuzão), talvez seu trabalho mais consistente. Agradando a atual demanda por sons rave 90, a primeira metade do set foi bem comercial, téquinêra pesada (e ainda sim bom, sim é possível), encerrada com um explosão de fumaça ao som de “Also Sprach Zarathustra”, para marcar a transição para um som mais com a sua cara.
E essa cara é um groove borrachudo, sirenes de synth, camadas de melodia se cruzando, a bateria 909 estourando no peito, em remixes de “Harder Better Faster Stronger” (Daft Punk), “Blue Monday” (New Order) e “Mr. Brightside” (The Killers, de quem também produziu o terceiro disco). Mesmo com o dia claro, a pista pegou e pegou bem.
Andrew Bird
Numa mudança brusca, o tUnE-yArDs pegou um palco grande demais para o seu som. O som etéreo, de tempos e divisões estranhas e melodias tortas, lembrando bastante o Dirty Projectors , não consegue cativar uma multidão. A atmosfera experimental e hippie provavelmente ganha muito se vista, por exemplo, num centro cultural ou na sala de casa de um dos integrantes. Andrew Bird entrou na sequência e fez um show correto com seu folk e violino, sem empolgar muito.
No almoço deu para ouvir Noel Gallagher apelar para “Don’t Look Back In Anger”, do Oasis, pra conquistar o público. Mesmo sem nenhum hit desse calibre no repertório, quem não precisou de muitos truques pra fazer um dos shows do festival foi a Feist. 19 pessoas no palco, som perfeito, o máximo da apelação foi uma piada dizendo que uma de suas músicas era sobra de estúdio do “The Chronic”, clássico do Dr. Dre, estrela maior do Coachella esse ano. Bem classudo.
Flying Lotus
Embicando para o final, vei uma sequência na tenda pequena, começando pelo trecho final da apresentação do Flying Lotus, dessa vez acompanhado por baixo e bateria, tão bom quanto sempre nos toca-discos.
Logo depois entrou o SBTRKT. Acompanhado apenas pelo cantor Sampha, o produtor Aaron Jerome reconstrói as músicas, tornando-as muito mais peadas e minimalista (show todo no DM).
SBTRKT
Passando uma lixa na produção detalhada do disco, tirando todo polimento pop, “Never Never” vira um dubstep dark, “Something Goes Right” não repete as programações, o sintetizador some e surge reta e seca. “Wildfire”, na versão com Drake e cantada por Yukimi Nagano (do Little Dragon), que deveria ser a mais adaptada devido a ausência dos intérpretes, é praticamente tocada como é gravada, antes de um final em que é toda entortada.
O ponto fraco é a decisão de Aaron de tocar bateria ao vivo (ele e Sampha dividem os sintetizadores). O que poderia ser um adendo interessante pro show acaba limitando as execuções pelo simples fato dele ser um baterista regular, porém incapaz de repetir as programações originais na munheca. Com isso, todo o show acaba sendo mais linear e perdendo dinâmica. A discussão se um artista novo deve ou não alterar tanto suas músicas quando tem apena um lançamento é secundária. Afinal, cada artista sabe de si.
Um integrante do ASAP Rocky vai pra galera
Certo de que o Radiohead não entraria em cena no horário marcado, fiquei para ver um pouco do ASAP Rocky. Acompanhado por 11 amigos no palco, pulando e dançando sem parar, alguns fazendo raps ou se jogando na plateia, do pouco que deu tempo de conferir, pareceu energético, embora rapidamente se torne monótono com a presença de apenas um DJ em cena.
Radiohead
Atração principal da noite, o Radiohead fez um show basicamente focado no “The King of Limbs” e no “In Rainbow”, com algumas concessões. No geral, foi um repertório mais lento e o cansaço de um dia inteiro de shows, somado ao frio, congelou o público.
A amigos, o guitarrista Ed disse que foi um dos piores shows do Radiohead em muito, muito tempo. Foi um certo alívio saber disso, aliviando um pouco a culpa de ter saído um pouco antes do fim (não aprendo…) para evitar o engarrafamento da saída do estacionamento.
O sol! O Sol!
Dia 3 Metronomy, SeunKuti & Egypt 80, Real Estate, Beats Antique, araabMUZIK, The Weeknd, Justice, At The Drive In, Dr. Dre & Snoop Dogg
Josh Homme é fã do Metronomy
Eis que no derradeiro dia o sol apareceu, mudando COMPLETAMENTE a atmosfera do festival. O dia começou bem, com o Metronomy fritando o coco no palco menor, transformando o gramado numa pista de dança. Josh Homme (Queens of the Stone Age) foi tietar a banda nos bastidores após o show e foram embora juntos.
Santigold
Finalmente deu para aproveitar o calor e curtir o visual do deserto largado no chão, ao som do Seun Kuti e a lendária Egypt 80. A melhora no clima aumentou a pilha, então deu pra correr descalço e ver um pedaço da Santigold, grande, dominando o palco principal bem cheio.
De lá, para o Real Estate. Longe de ser algo elaborado, é na simplicidade que eles se dão bem (show inteiro aqui – e que beleza é não ter que subir essa quantidade de vídeos no YT!).
Real Estate
O indie preguiçoso se destaca pela guitarra enxarcada de Matthew Mondaline (também do Ducktails) e pelas longas incursões instrumentais, apoiadas em camadas de teclado (o pai do tecladista mora no Rio e trabalha n Bloomberg, ele contou depois). De ruim, a demora entre as música para afinação dos instrumentos, atrapalhando a fluidez. Uma belezura de show que teria ido muito bem no por do sol.
Thundercat
Produzido por Flying Lotus, o Thundercat fez um show de jazz funk chato enquanto na tenda ao lado, a Mojave, o Beats Antique orientalizava o hip hop através do balkan beats, com banda e dançarinas exóticas, antes do araabMUZIK destroçar os sonhos de qualquer um que toque ou queira tocar uma MPC.
araabMUZIK
O prodígio americado descendente de guatemaltecos e dominicanos arregaça não uma ou duas, mas três MPC, numa velocidade e destreza assutadoras. Isso sem perder de foco o pequeno detalhe de fazer um som bom, algo que poderia ser relegado a segundo plano, encoberto pela performance, construindo batidas e melodias e samples de Damian Marley. No palco principal, o The Hives se esgoelava.
Com finalmente um sol para se por, a melhor escolha de banda para esse horário de ouro do festival flopou desastrosamente (veja você mesmo). Reunindo o maior público visto no palco menor, com muita gente sabendo as letras de cor e sendo celebrado com gritos histéricos dignos de ídolos adolescentes, o The Weeknd não correspondeu.
The Weeknd
Com uma voz pequena e sem alcance nenhuma, Abel Tesfaye mais geme do que canta. Ele não se aperta e bota banca, com atitude de postar, como se não fosse um sub D’Angelo ou Justin Timberlake e não percebesse que está mais próximo de um participante do American Idol do que de qualquer um dos citados.
A banda – ou os arranjos – não ajudam, soando vazia naquela imensidão a céu aberto. Uma grande decepção, considerando as boas mixtapes, no nível da causada pelo The xx, naquele mesmo lugar e horário. Agora, como dito lá em cima, pode ser questão de tempo, estrada, experiência mesmo. O The Weeknd ainda é pequeno.
Contrariando o que vinha sendo comentado, o Justice não se apresentou com uma banda e mostrou praticamente o mesmo show do disco passado, adicionando apenas luzes aos amplificadores cenográficos e as música novas de sonoridade parecida (já que o disco é mais hard rock do que metal), como “Orion”. A banda entrou bastante atrasada e fez um set bem curto num espaço já limitado de tempo. Muito pouco para o palco principal, mesmo sendo muito bom.
Espremido entre a catarse causada pelo Girl Talk no palco menor e o poperô do Calvin Harris (com Rihanna como convidada) na Sahara, o Beirut se esforçou pra conseguir se fazer ouvir na Gobi. Tarefa ingrata para eles e para os muitos que lotaram a tenda na esperança de ver o show.
No palco principal o At The Drive In fez seu retorno, enquanto a Florence and The Machine agradava a mulherada no menor. Nada disso importava, a essa altura o campo de polo já estava a espera de Dr. Dre, Snoop Dogg e sua turma.
Dr. Dre & Snoop Dogg e todo o resto
Como num especial de TV, Dr. Dre fez as vezes de anfitrião, falando bem mais que Snoop, enquanto recebia seus convidados (já sabe: clique e assista o show todo). Passeando quase cronologicamente por alguns dos sucessos que produziu, recebeu Kurupt, Warren G, homenageou Nate Dogg (morto recentemente), ouviu Snoop puxar “Jump Around” do House of Pain e cantar “Young, Wild and Free” com Wiz Khalifa e então o caldo começou realmente a engrossar.
Confirmando os boatos, 50 Cent e depois Eminem também participaram, transformando a noite num encontro de medalhões do hip hop, faltando apenas Jay Z, Lil Wayne e Kanye West pra fechar o primeiro time (mas eles não tinham nada a ver com aquilo). O que aconteceu entre essa duas apresentações foi o que se tornou o assunto mais comentado do Coachella, possivelmente não apenas dessa edição.
Durante o dia já rolava um falatório sobre a participação virtual do Tupac, o próprio holograma (papo que você vem escutando falar aqui no URBe pelo menos desde 2006) sendo citado. Não deu outra. E mesmo sem ser exatamente uma surpresa, causou espanto no sentido estrito da palavra. Mais do que uma comoção ou celebração, a visão de Tupac no palco, gritando “qualé Coachellaaaa”, deixou o clima meio sombrio. Era mais como ver um espírito do que o artista. Embora o objetivo não pareça ter sido esse, funcionou, afinal, o rapper foi assassinado há 16 anos.
No final, mesmo com a chuva e escalação “tímida” (e bota aspas nisso!), foi uma das edições que mais repercutiu. Curioso pra saber qual vai ser a história ano que vem.
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Obs 1 – Para assistir: Tem alguns links para vídeos com os shows inteiros no texto. Uma busca no Google por “nome da banda” + Coachella + full entrega os resultados. Muitos dos vídeos estão marcados como “privados”, para não serem tirado do ar pelo YouTube, então uma busca no próprio YT não acusa. Tem muitos no DailyMotion também.
O caos do ano passado foi uma visão triste. Filas por toda parte, dificuldade para assistir os shows, gente demais no lugar. Em uma de suas edições de atracões mais quentes (todo mundo estava tocando), o Coachella aparentava ter ficado grande demais. Ficou no ar a questão: valeria a pena voltar em 2011?
Mas… que outro festival do mundo tem esse sol, essa escalação e esse clima tranquilo (mesmo no ano do tumulto)? A praticidade conta e, chegada a hora (e “a hora” é meses antes da data), a esperança de melhora, confiando no histórico do evento, transportaram a mente até o deserto. Como se sabe, a mente decide, o corpo só obedece. Em abril, o destino era Indio.
Com a proximidade do festival, as notícias eram boas. A organização arrochou a segurança para evitar invasões, aumentou muito a área do evento e redistribui as praças de alimentação, vendeu menos ingressos, diminui os convites, o credenciamento de imprensa e instituiu um controle mais rigoroso na entrada, com pulseiras com chips. Com a importância que tem hoje, o Coachella não poderia mais mesmo liberar entrada com ingresssos impressos em casa.
A grande diferença em relação a 2010 foi a própria escalação. Num consciente passo atrás, o Coachella deu uma segurada no tamanho das atrações, ou na quantidade de nomes muito grandes. O que foi visto por alguns como enfraquecimento, provou-se uma decisão acertada. Era necessário esfriar as coisas um pouco.
Quem já foi sabe, não adianta ler a lista de mais de 100 atrações e achar que conseguirá assistir tudo. frustração certa. No Coachella existem diversos caminhos e, uma vez escolhido o seu, é melhor esquecer todo o resto.
Como uma das coisas mais legais é a oportunidade de assistir justamente os shows menores, mais difíceis de se ver em outros lugares ou mesmo em casa, os medalhões não fizeram tanta falta. E olha que tinha bastante gente grande.
Foi muito bom ver o festival retomar o seu espírito inicial. Muita gente atrás de música boa, bem menos pessoas na badalação e a oportunidade de se poder assistir tranquilamente tudo que se escolhesse. Abaixo, um remix da cobertura por twiter, agora com bem mais do que 140 caracteres, que fiz das minhas escolhas (sem revisão, depois faço adendos, links e acerto os eventuais erros).
Dia 01 Black Joe Lewis & The Honeybears, Brant Brauer Frick, The Drums, Odd Future, Warpaint, Tame Impala, Lauryn Hill, Sleigh Bells, Black Keys, Kings of Leon, Emicida
A saga de três dias começou com o Black Joe Lewis & The Honeybears, pegando bem mais pesado do que o groove de sua música mais conhecida, “I’m Broke”. Com uma metaleira funk, o que se destacava mesmo eram os riffs de guitarra, fugindo das expectativas. Saindo de lá, ainda deu tempo de conferir o finalzinho do Brant Brauer Frick, filhotes de Kraftwerk tocando eletrônica.
The Drums
Primeira atração mais conhecida do dia, o The Drums confirmou a fama de ruim de palco, com um show bem morno, apesar da força que o vocalista faz para emular Ian Curtis. O som brilha demais ao vivo, perdendo um pouco da introspecção. Ruim não é, só não empolga.
O que prometia empolgar era a polêmica molecada do Odd Future. Nomes da vez do hip hop (ao menos o undergrond), estava numa marra sem tamanho antes antes mesmo do show começar. Com 10 minutos de atraso (gigantesco para pontualidade do Coachella), xingando o técnico de som, entraram com um sub-grave chacoalhando a tenda aos gritos de “Wolf Gang! Wolf Gang!”.
O cenário estava promissor, não fosse o fato de não haver uma banda no palco (não que se esperasse uma) e a correria para pegar o Warpaint do começo. Quem também atrasou foi o Cee-lo Green, tendo tempo de cantar apenas quatro músicas antes do som ser cortado e sair sob reclamações do público.
Warpaint
O do Warpaint arrastou bastante gente para o palco aberto menor e fez valer a pena, com o primeiro bom show do Coachella. As harmonias vocais, com camadas de guitarras ao fundo, fazem delas um Fleet Foxes indie, com momentos delicados, hora lembrando The xx, hora o Explosions In The Sky.
Fez muito sentido uma banda só de mulheres no festival com um público de maioria feminina. É praticamente um desfile. Falando na mulherada, ia fazer vários vídeos com elas resenhando os show, chamaria “Hot Chicks Review Coachella”, com grande potenciarl viral. A preguiça não deixou.
Tame Impala
O pôr-do-sol é o momento mágico do Coachella e o shows escolhidos para essa hora nos palcos ao ar livre são sempre especiais. Os do palco menor, mais aconchegante e melhor posicionado para o visual, costumam ser os melhores.
Não por acaso, foi justamente nessa hora e local que o Tame Impala fez o melhor show do festival. Falar em mistura de rock setentistas (Led Zeppellin, Floyd, Beatles, Cream, King Crimson) faz soar pouco inspirado, quase óbvio. O diferencial é o que os australianos adicionam.
Como se todas as influências passassem obrigatoriamente por um filtro pós-stoner (não esqueçamos que os garotos tem 20 e poucos anos, os anos 70 estão lá atrás), as guitarras se arrastam, enquanto o baixista olha para a bateria com um faminto para um prato de comida, mantendo o encaixe perfeito, e o vocal voando em efeitos pelo ar seco.
A chapação psicodélica debaixo do sol desértico foi uma experiência e tanto. Não poderia haver lugar melhor.
Sleigh Bells
Pausa para o almoço ao som da Lauryn Hill, bem disposta e com um bandão, mandando “Ready Or Not” e outros sucessos dos Fugees, antes de conferir o Sleigh Bells.
Ao vivo, a podridão da dupla faz muito mais sentido do que em disco. Com apenas a vocalista e um guitarrista em frente a uma parede de amplificadores Marshall, não sei qual dos dois soltando as bases eletrônicas, o Sleigh Bells abriu logo entregando as referências, ao som de “Iron Man” (Black Sabbath).
A blusa da cantora era uma réplica da 23 do Jordan no Chicago Bulls, com o nome da banda no lugar do jogador, dava mais senhas. Os anos 90 se (re)aproximam e o Sleigh Bells consegue ser ao mesmo tempo metal, hip hop e Miami bass, lembrando em vários momentos o NIN ou um Prodigy mais lento.
Prontinha pra estourar, até um hit mais calminho eles tem, uma fofurinha na onda de “Paper Planes” (M.I.A.) que não encontrei ainda pra escutar outra vez. Esse troço no Brasil ia ser bom demais.
No palco principal, o Black Keys fez um show correto, bastante prejudicado pelo som, baixo e falhando. O problema se repetiu em outros shows por ali, algo fora do normal para o Coachella.
KoL
De banda que mal sabia passar de uma música pra outra, a banda grande (com “super” telão, horrorendo, com todos os efeitos que o operador pudesse encontrar), fechando uma noite do Coachella, foi um longo caminho, no qual o Kings of Leon perdeu bastante do que a fazia interessante.
“Vamos tocar coisa antigas, estamos cansados das novas”, disse Caleb Followill, para melhorar as coisas. Assim, o show foi bem mais legal do que poderia ter sido e ainda acendeu a esperança de que o caminho poser atual possa estar com os dias contados. Quem sabe, com os bolsos cheios, talvez eles mesmos queiram retomar o caminho anterior.
Emicida
Depois dos problemas com o visto, Emicida teve dor de cabeça na imigração, perdeu a conexão para Los Angeles em Atlanta, se atrasou e perdeu o horário do próprio show. Na hora marcada, a tarde, um DJ botava som na tenda Oasis.
Remarcado para as 23h30, a apresentação foi para uma dezena de testemunhas. Fora do horário – na realidade tocando num horário em que a tenda já deveria estar fechada – visivelmente incomodado com a situação, Emicida tocou para quase ninguém. Uma pena.
Fechando a noite, o Chemical Brothers atrasou mais de meia-hora (muitos atrasos, como se vê) e não deu pra esperar. Tinha mais dois dias da maratona pela frente e era preciso descansar. No caminho para o carro deu pra ouvir “Star Guitar”, alto pra cacete, uma belezura que só.
Dia 02 The Twelves, Bomba Estereo, Here We Go Magic, Foals, Radio Dept, Two Door Cinema Club, Erykah Badu, Broken Social Scene, The Kills, One Day As A Lion, Big Audio Dynamite, Animal Collective, Arcade Fire
Dormiu, acordou, começou o Coachella de novo. Sol a pino no dia mais quente do festival. Zooey Deschanel deu uma volta pelo gramado e até Paul McCartney passeou pelas tendas – vi o tumulto na área de imprensa e quando disseram que era ele, pensei que era pilha.
Aproveitando que o trânsito estava colaborando, foi dia de chegar cedo, a tempo de pegar o The Twelves na Sahara, a maior das tendas, 13h30.
12s
No dia anterior, João e Luciano estavam preocupados. Tiveram o laptop roubado na Colômbia e por isso, além de ter que usar com um computador reserva, inferior ao original, teriam que tocar a partir de uma versão mais antiga dos arquivos do seu show.
Fora isso, havia outra nóia: de que tocando tão cedo, não haveria ninguém para assisti-los. Nenhum dos receios se confirmou. O set rolou perfeito no computador substituto e a tenda estava muito cheia, até o fundo. Melhor do que isso, o público embarcou bonito no repertório de remixes de M.I.A., Daft Punk e Black Kids.
Não é fácil sacudir o povo debaixo de um calor insano e de dia. Os niteroienses do The Twelves não apenas conseguiram, como saíram ovacionados, aos gritos de “olê olê, olê olê” (gringolês para “viva sulamericanos”) e gente levantando a bandeira do Brasil. Tarefa cumprida, com louvor.
No palco principal, o Bomba Estereo tocava o zaralho para os que estavam aguentando o sol na moleira. No palco menor, o Here We Go Magic fez um show correto e xoxo. A banda embarca num lance sub-Yo La Tengo, sub-su- Wilco, longe do folk com efeitos da ótima “Tunnelvision”, última música do show, em versão mais carregada nas guitarras e esporros.
Logo depois, o líder do Gogol Bordello protagonizou uma das cenas mais feias da história do Coachella. Claramente sabotado, foi obrigado a subir ao palco com uma blusa do Fluminense, para horror do público, sem entender a bizarra combinação de cores, mesmo num show do Gogol.
We Put Out
Foals
A aposta no Here We Go Magic custou metade do show do Foals, que com apenas metade da apresentação botou muitas outras atrações no bolso. Com suas melodias, bateria quebrada e guitarras fraseadas, o Foals poderia se tornar uma banda de estádio se tivesse mais exposição. O público cantava tudo, fazia coro e batia palma.
Vendo esse tipo de resposta do público ao Foals é a certeza de que todos ali baixam músicas e só conhecem a banda por isso. É uma constatação besta e lógica, porém não se pode perder de vista que ainda há bastante gente que não baixa (por medo, por não saber, por culpa).
O Foals ainda não foi mastigado e digerido pelo grande público talvez por conta disso, por não ter chegado a eles ainda. Se chegasse a mais gente, o sucesso poderia ser proporcional. A questão é: isso é desejado/desejável? No ano passado, com a escalação repleta de bandas do indiestream, foi o pandemônio que foi.
Na tenda menor, Gobi, o Radio Dept. fez um show sonolento, baixo e sem sal. O som estava uma desgraça, como se os integrantes tivessem esquecido cobertores sobre os amplificadores.
2DCC
De volta a tenda Mojave, o Two Door Cinema Club teve público e recepção de bandas que tem bem mais estrada com eles. Sem economia, “Something Good Can Work” apareceu como terceira música, levantando de vez a plateia. Mesmo sem a mesma pressão do show no Circo Voador, até por conta do tamanho do espaço, deu saudades do verão Queremos.
Erykah Badu
Pausa para o almoço, ao som de Erykah Badu. A diva escolheu um repertório um tanto irregular e, ao estourar o tempo, teve o seu som cortado no meio de uma música. Bandão, tudo no lugar, só o horário atrapalhou, e também o palco. Como era dia ainda, em uma das tendas poderia ter dado mais liga.
Broken Social Scene
A hora mágica, dessa vez no palco grande, foi reservada para o lindo show do Broken Social Scene. Mesmo pra quem não é fã da banda, daqueles de saber todas as músicas, o show foi uma beleza. Difícil era decidir entre assitir ao show ou simplesmente escutá-lo, observando o por do sol e curtindo a tranquilidade do gramado, relaxando e pensando na vida. A segunda opção é um dos grande diferencias do Coachella, um festival que se basta, independente das atrações.
The Kills
Já de noite, quase pulei o The Kills, que fazia um show bem bom, até dar a hora de conferir o One Day As A Lion e ser deixado no meio.
One Day As A Lion
Projeto de Zack De La Rocha, vocalista do Rage Against the Machine, o One Day As A Lion é feroz. Acompanhado de um baterista (Jon Theodore, ex-Mars Volta) e dois sintetizadores fazendo os riffs linhas de baixo e porradas de graves, com Zack tocando um deles algumas vezes.
A estrutura das músicas do combo de synth metal lembram as do RATM muito mais nas versões gravadas do que tocadas ao vivo, quando ficaram bem mais barulhentas e pesadas. A frente da tenda virou uma roda de pogo de 45 minutos, com a pancadaria comendo solta e bastante fair play, com os nocauteados sendo levantados pelos participantes.
Em meio as cotoveladas e ombradas, um casal destoava. Ele de blusa branca e calça jeans, ela de vestidão azul meio hippie, curtiam o show da primeira fila, enquanto eram lançados de uma lado para o outro. Deu gosto ver.
Animal Collective
Embicando para a reta final, o Big Audio Dynamite, com Don Letts pulando e cantando animadaço, divertiu na mesma proporção que o Animal Collective constrangeu. Com iluminação especial da estrutura do palco e telão feito pelo Black Dice, a sequência de ruídos que nunca formavam uma música era de uma pretensão e chatice tão grande que faziam até desejar que o Arcade Fire começasse logo.
Nada contra os canadenses, questão de gosto mesmo. Fora “The Suburbs” e “Ready To Start” – dois musicaços – aquele clima Iron Maiden de “ôôô” que não acabam não é pra mim. A afetação de alguns integrantes, um excesso de uma “garra” forçada, cansam. Ainda assim, o show é inegavelmente bom e vale a pena se assistido nem que apenas pelo espetáculo.
Nesse quesito, o Arcade Fire não decepcionou. Começou com um filme, projeto abaixo de um letreiro de cinema com o nome da banda. Durante o show a briga entre as imagens do telão do palco (do festival, sempre classe) e do telão no palco (do Arcade Fire) foi bem boa.
Perto do final, uma caixa enorme foi içada por um guindaste acima do palco e ficou claro que a prometida surpresa estava próxima. Quando começou a cair bolas e mais bolas brancas lá de cima, pensei que o Arcade Fire fosse conseguir se superar no nível chatice, ao multiplicar por dezenas a pentelhice daquelas bolas que só atrapalham quem quer ver o show.
Que nada. Quando as bolas começaram a piscar e mudar de cor, coordenamente, revelando um sistema remoto de controle dos LEDs embutidos em cada uma delas, a coisa literalmente mudou de figura. Fato que atrapalhou um bocado a visão do palco, porém para quem estava atrás apenas do espetáculo, foi um lindo encerramento.
Assim, o show do Arcade Fire, contra todos os prognósticos URBísticos, entrou no top 5 do Coachella 2011. Isso quer dizer muito de um festival que, mesmo com uma escalação supostamente mais fraca que a do ano anterior, conseguiu superá-lo. O Coachella é mais do que os shows.
Cansou? Levanta que ainda tem mais!
Dia 03 Menomena, Delorean, Nas & Damian Marley, Wiz Khalifa, Best Coast, Foster The People, Duck Sauce, The National, The Strokes, Kanye West, Leftfield, The Presets
O terceiro e derradeiro dia foi também o mais devagar em termos de atração, o que caiu bem para as costas e pernas chumbadas. O clima era de sábado, com o maior público dessa edição, culpa do Kanye West.
Nova geração: os hipsters estão salvos
Delorean
O dia começou logo com duas decepções, a mesmice do Menomena e o aguardado Delorean. Com baixo, dois sintetizadores e batera com pad no lugar dos tons, o Delorean focou no “som dançante” e conforme o show foi caminhando, passou a atirar cada vez para mais lados. Falta alguma coisa, a banda ainda é bem crua e falha na unidade.
Nas & Damian Marley
Iniciando os trabalhos do hip hop, Wiz Khalifa tentou demais agradar a platéia bem cheia da área principal, mas o pessoal não entrou na dele não. Show de hip hop sem banda é um negócio complicado pra funcionar num festival. MCs e DJs num palcão daqueles fica muito magrinho, some na imensidão.
Pra comprovar a teoria, Nas & Damian Marley vieram logo na sequência, com um bandão e provocaram uma catarse com o projeto que une rap e reggae. Além das músicas originais da dupla, Nas levantou o gramado primeiro, com a sua “If I ruled the world”, antes de Damian lançar “Welcome To Jamrock” e juntos mandarem “Could You Be Loved” (Bob Marley). Clichê, sem dúvidas, só que funcionou que só vendo.
A despedida do por do sol foi com o Best Coast, num show chato. A vocalista tem uma falsa modéstia irritante para falar de si própria, atestada pela quantidade exagerada de vezes que fez isso, ainda mais no curto tempo do show. O som vira uma espécie de Hole mais lento, o que pode ter certeza, não é um elogio.
O Foster The People fez mais um show chato (escrevendo agora não há duvidas, domingo foi o pior dia), um troço meio brega, querendo ser arena ou sei lá o que. A essa altura, o festival já migrava para Sahara para conferir o Duck Sauce, cuja “Barbara Streisand” foi ouvida cantarolada o dia todo.
Se existe um atalho rumo ao sucesso eletrônico no Coachella ele é o 4×4 com toques de farofa. O Duck Sauce não fugiu a receita, ainda que tenha surpreendentemente regulado a farofinha.
Na hora do jantar, The National de trilha. Hora mais tarde, no aeroporto, o guitarrista Bryce Dessner falou que o show do Rio dificilmente será superado e que havia falado do Queremos para diversas bandas, entre elas o Sufjan Stevens, que gostou muito da ideia. Veja só.
The Strokes
O show do Strokes foi um caso a parte. O cenário simples, seis setas de tecido iluminadas por cores alternadas era simbólico. Com três setas apontando para um lado e três para o outro, era como se representassem forças opostas, puxassem a banda em diferentes direções, tal e qual os recentes relatos da convivência do grupo.
Se isso é o Strokes brigado, está ótimo. Mesmo com as músicas novas funcionando meio mal e a banda meio desconectada e burocrática, o show foi divertido. Julian Casablancas perdeu a linha nos papos com o público (pensamentos em voz alta define melhor) entre as músicas.
Numa viagem “artista artomentado”, zoou o público, Kanye West, Duran Duran, os integrantes e técnicos da própria banda… Não sobrou nada de pé. Lá pelas tantas mandou “Aê, Kanye depois, hein!”, ao que a galera responde aos gritos de “Ééé!” até ser interrompidos com um “vocês estão de sacanagem? Como ousam?”, de Julian, rindo de si mesmo.
Sentindo-se obrigado a fazer o papel de estrela do rock e atração principal do festival, fazia perguntas idiotas ao público, como “vocês acreditam no amor?”. O deboche parecia mais voltado a própria banda, como se estivessem ali cumprindo uma obrigação. O que, sendo esse o caso, fizeram com qualidade.
Se o Julian chegar no Planeta Terra com metade das piadas do show no Coachella, esse show do Strokes já esta valendo.
Acabou
Na saideira, deu pra pegar a parte final do Leftfield, de volta e meio fora de prumo, utilizando Theremin e batidas quase techhouse. Quando as músicas antigas tiveram vez, como “Phat Planet”, as coisas iam bem. Fechando a tampa, duas músicas do Presets foram o suficiente.
Um último dia bem morno em termos musicais, porém feliz ao se constatar que o Coachella atual ainda pode ser o Coachella de alguns anos atrás. Agora que o caldo deu uma esfriada, é esperar para ver o que acontece no ano que vem. Abril de 2012 já está pré-reservado para a ida ao deserto.
fotos e vídeos: URBe
+ alguns outros encontrados no YouTube
Atmosfera hippie, nuvens, instalações, vento, fumacê e marola, poeira, sorvete de limão, engarrafamentos e, obviamente, apresentações antológicas, daquelas que fazem valer cada centavo investido na viagem.
O Coachella 2010 foi marcado pelo crescimento, tanto do festival como das bandas que por lá passaram. Desde o anúncio de suas mais de 100 atrações essa edição do festival californiano estava sendo chamada de “o maior Coachella de todos os tempos”.
Com uma escalação desesperadora de tão caprichada, decidir que apresentações perder foi mais difícil do que eleger o que ver. De qualquer forma, assimilar 30 shows ao longo de apenas três dias não é fácil. Mesmo espalhados ao longo de um ano seria bastante.
Leva algum tempo até as idéias se organizarem, os detalhes vão ressurgindo, o volume de informação se diluindo, até começar a se ter um entendimento completo do que aconteceu e o prazer de redescobrir as memórias dura um bocado.
Com a natureza enlouquecida do jeito que está , a apreensão de um terremoto atingir o sul da Califórnia durante o festival, ainda bem, não se confirmou. Porém nem assim o Coachella escapou de problemas ou mesmo dos desastres naturais.
A erupção do vulcão na Islândia interrompeu os vôos na Europa e provocou o cancelamento de vários artistas. Esse foi o menor dos problemas.
Esse ano foram vendidos 25% mais ingressos do que nas últimas edições, aumentando de 60 para 75 mil o número de frequentadores espalhados num espaço físico exatamente do mesmo tamanho de outros anos, prejudicando a tranquilidade, uma das características mais positivas do festival.
Pra agravar a situação, não houve venda de entradas avulsas, somente o pacote para o três dias, superlotando o lugar (a liberação de entrar e sair do acampamento não resolveu esse giro) e gerando vários problemas de organização, o maior deles o estacionamento, além da sujeirada.
Pode parecer chororô, até saber-se que no primeiro dia muita gente (o/) levou até quatro horas para conseguir entrar no evento e em média três para sair. Nos outros dias a situação melhorou, porém a melhor opção foi mesmo chegar muito cedo e pagar 20 dólares para utilizar um dos estacionamentos privados que pipocaram em quintais de casas das redondezas.
Para sorte dos organizadores, o que realmente será lembrado é a passagem do Jay Z pelo festival. Foi o Coachella do Hova, só dava ele, em toda parte, o tempo todo. O rapper monopolizou as atenções de uma maneira que nem Paul McCartney fez, com quase todos os artistas perguntando ao público sobre o show do rapper.
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Dia 1: Chegando devagar She & Him, Gil Scott-Heron, Them Crooked Vultures, LCD Soundsystem, Vampire Weekend e Jay Z
She & Him
Vencida a lentidão do trânsito e da fila da porta, não sobrou tempo para lamentar a perda dos shows do Wale e do Yeasayer. Já passavam das 17h e foi preciso correr pra chegar a tempo ao palco menor para conferir o She & Him.
She & Him, “Why Don’t You Let Me Stay Here”
Com o sol batendo na sua pele branquinha e refletindo no vestido azul de corte retrô, Zooey Deschanel encantou os marmanjos e as meninas com sua meiguice, bonita voz e mais entusiasmo do que técnica no teclado, pulando sem parar.
A combinação de folk, indie, anos 50, Fleetwood Mac é um acerto, mesmo que não seja realmente empolgante. Não fosse pela estrela de Hollywood, provavelmente a banda teria passado despercebida, o que só mostra como o guitarrista M. Ward, o Him da dupla, é um sujeito de visão.
Gil Scott-Heron, “Three Miles Down”
Na tenda, longe da corrida do hype, Gil Scott-Heron mostrou como se faz. Magrinho, com o rosto escondido por uma boina e parecendo frágil, o herói do funk soul chegou devagar, na classe.
Antes de começar o show, foi a frente do palco bater um papo com o público. Comentou sobre a falta de tempo para passar o som adequadamente, agradeceu a presença de todos, sentou em frente ao Rhodes e, quando abriu a boca, mostrou que sua voz grave continua firme, mesmo que um tantinho mais fraca.
Acompanhado apenas por um percussionista, outro tecladista e um saxofista/gaitista, Scott Heron transformou suas músicas em temas mântricos, como grandes introduções marcadas pelo improviso nas letras, sem nunca estourar.
Gil Scott Heron
Mostrando bom humor, Heron perguntou quem já tinha escutado a música do Common. “Fui sampleado”, disse, arrancando risos. “Não é tão ruim quanto soa e não dói, é ótimo para apresentar minha música para outras pessoas”.
E continuou: “Quando isso acontece, a primeira coisa que você faz é chegar em casa e ouvir o seu disco, pra ter certeza que está soando direito”, disse antes de emendar “Home is Where the Hatred Is” (sampleada por Common e Kanye West) e “Did You Hear What They Said?” (sampleada por Freeway). No seu novo disco, “I’m New Here”, foi Scott-Heron quem sampleou “Flashing Lights”, do Kanye West.
Após o encerramento com “In The Bottle”, algo que Scott-Heron falou logo no início fez ainda mais sentido: “para aqueles que apostaram que eu não estaria aqui, vocês perderam”. Perfeito.
Them Crooked Vultures
Já era noite e o Them Crooked Vultures foi o primeiro a arrastar uma multidão para o palco principal. Mesmo com a presença de Jon Paul Jones (Led Zeppelin) e Dave Grohl (Nirvana, Foo Fighters) tocando bateria, a liderança de Josh Homme é aparente, talvez até porque em seu caso o projeto seja maior que sua banda principal, coisa que não acontece com os outros.
Por mais que a contribuição dos outros integrantes seja perceptível, a sonoridade não esconde que Homme conseguiu montar uma formação dos sonhos para o seu Queens Of The Stone Age. Fosse somente mais uma banda nova, o Them Crooked Vultures já seria relevante. Poder ver Dave Grohl na bateria e Jon Paul Jones no baixo só faz tudo mais especial.
Them Crooked Vultures, “Gunman” e “New Fang”
Em casa no deserto, Hommes estava feliz da vida, dedicando música para James Murphy, líder da sua “banda favorita, LCD Soundsystem”.
LCD Soundsystem
De terno branco, foi justamente Murphy quem ocupou o palco principal em seguida. Iluminada apenas pela luz rebatida pelo globo de espelhos gigantesco pendurado em cima do palco, a entrada do LCD Soundsystem no palco principal sinalizou a grande mudança apresentada pelo Coachella 2010.
Passada a primeira década das “bandas de internet” lutando pra chegar ao seu público através de blogues e redes sociais, observa-se agora a consolidação de muitos desses nomes como grandes destaques.
Tendo estado em duas das três tendas do festival em anos anteriores, o LCD Soundsystem assumiu o palco principal como penúltima atração da noite e confirmou a aposta, echendo o lugar.
LCD Soundsystem, “Yeah”
Falante, Murphy comparou a situação com um restaurante. Se antes ele era o amendoim aperitivo, hoje ele ainda não era o filé de carne (esse era o Jay Z, disse Murphy), mas já podia ser considerado o peixe.
Num restaurante vegetariano essa comparação perderia todo sentido, como também perdeu embaixo dos holofotes. Ou Murphy tem baixa auto estima ou então até hoje não entendeu que no Coachella essa hierarquia não existe. Os diferentes palcos e tendas são somente diferentes ambientes, tanto é que Daft Punk e Madonna já tocaram nas tendas.
Em muitos momentos, a ironia de Murphy se confunde com arrogância e falsa modéstia, como antes da chatóide “Drunk Girls” debochou ao comentar sobre o vazamento online do seu terceiro disco.
Felizmente, o sujeito é bom mesmo comandando sua banda e é com isso que ele se ocupa a maior parte do tempo. As versões violentas de “Loosing My Edge” (dedicada a Gil Scott-Heron) e “Yeah”, ambas numa fúria crescente, “All My Friends” quase arrancando o dedo do pianista mostram que o LCD nunca foi amendoim.
A transmissão pelo telão estava espetacular, simplesmente não tinha um plano feio, nada mal enquadrado ou fotografado, um corte mal feito. Faz tempo que não basta uma câmera de frente para o palco para se ter um telão e o Coachella sobra nesse quesito. Cada show poderia render um DVD.
O Vampire Weekend já tocava no segundo palco quando a apresentação arrebatadora terminou, pra baixo, com “New York I Love You”.
Dava pra entender a presença da música quando a turnê era do disco em questão ou mesmo quando o LCD se apresenta em Nova York. Terminar um show tão animado dessa maneira é muito anti-climático.
O público levantou novamentequando viu pelo telão Murphy e Jay Z conversando nos bastidores, assim que o LCD saiu do palco.
Vampire Weekend, “Cousins”
Antes de Jay Z entrar em ação, a boa foi correr para assistir o que fosse possível do Vampire Weekend. Com o seu disco tendo conquistado o primeiro lugar da Billboard, em vendas físicas, não era surpresa nenhuma o quarteto lotar o lugar.
Vampire Weekend
O Vampire Weekend foi o primeiro artista a transformar o Outdoor Stage, mais intimista, numa filial do palco principal, sendo mais uma banda a mostrar que cresceu bastante. A quantidade de pessoas assistindo o show era, no mínimo, o dobro do que se costumava ver ali.
A música independente chegou as massas. Pode até ter sido que a escalação do Vampire no palco menor tenha sido proposital, forçando uma super lotação para mostrar a força da banda, essas coisas de gravadora. Eles estariam mais confortáveis no palco principal.
Mesmo tendo aumentado consideravelmente seu público, o show da banda continua no mesmo clima de antes, apenas amplificado. É uma pena que as passagens entre as músicas levem tanto tempo.
Jay Z, “99 Problems”
Pegando de onde o LCD Soundsystem deixou, o nova-iorquino Jay Z entrou em cena a la Michael Jackson, emergindo de um buraco no chão para exaltar a cidade que nunca dorme e convocar a platéia para quicar, com seus tradicionais gritos de “bounce!”.
Antes, é claro, tirou uma onda. Com 15 minutos de atraso, o telão passou a exibir uma contagem regressive de 10 minutos, ao som de “Don’t Stop Till Brooklyn” (Beastie Boys), so tema do James Bond e “Live And Let Die” (McCartney), como quem diz, “eu decido a hora que o show começa”.
Jay Z
O cenário era composto por objetos retangulares, multi-facetados, que recebiam diferentes projeções a cada música, podendo se transformar em Nova York (em “New York State Of Mind”) ou em uma torre de amplificadores (em “99 Problems”).
A banda é uma grosseria, gigante, conta com coral, metais, baixo, guitarra, duas baterias e um DJ, encorpando as versões ao vivo. A cada hit – e nos EUA são muitos – a platéia urrava, mostrando a força de um ícone americano cuja importância cultural é tremendamente difícil de transpor fora desse contexto.
Uma maneira ruim de encerrar um excelente show. Pior que isso, só mesmo o tumulto pra sair.
Dia 2: Coachella I love you, but you are bringing me down Girls, Camera Obscura, Temper Trap, Edward Sharpe and The Magnetic Zeros, The xx, Hot Chip, MGMT, Devo, Aterciopelados, Major Lazer, Flying Lotus, Dead Weather, David Gueta e 2ManyDJs
O desespero pra não passar pela mesma provação do primeiro dia fez bastante gente chegar bem cedo, o que foi ótimo, já que muitas vezes bandas interessantes tem pouco público devido ao horário.
O campo de polo onde acontece o festival continuava lotado e, pela primeira vez, sujo. As latas de lixo transbordavam e garrafas de plástico, copos e latas se espalhavam pelo chão.
Logo no Coachella, um festival conhecido pelas preocupações verdes e que em pleno calor do deserto dá uma garrafa de água para quem entregar dez vazias nos postos de troca, algo que sempre fez as garrafas serem disputadas.
O segundo dia era também um dia com poucos conflitos de horários e menos shows imperdíveis, de maneira que durante boa parte do dia a boa era ficar pulando de um para o outro.
O primeiro foi o do Girls, que queimou a largada abrindo com “Lust For Life” e depois não conseguiu segurar a onda. Na tenda ao lado, o Camera Obscura fechava seu show com canções muito lentas para o início de uma maratona musical.
Temper Trap
No palco menor, coube ao Temper Trap cumprir a função de sonorizar um momento tradicional do Coachella: assistir algum show sentado na grama, bem de longe, descansando as pernas.
Com algumas boas músicas, no geral são parecidas demais com o único hit do grupo, “Sweet Disposition”, da trilha do filme “500 Dias Com Ela”.
Assim que os australianos terminaram de tocar, foi a deixa para se enfiar na multidão e pegar um bom lugar pra assistir o The xx. Pra garantir, a melhor saída era entrar já no show anterior, dos desconhecidos Edward Sharpe and The Magnetic Zeros.
Edward Sharpe and The Magnetic Zeros
Desconhecidos o quê. Uma multidão aguardava ansiosamente o insano grupo de bluegrass, uma grata surpresa, com a presença de palco do Gogol Bordello, a grandiosidade do Arcade Fire e o (des)apego a tradição do Kings of Leon. Falando assim soa melhor do que de fato é, mas “Home” é muito boa e foi cantada aos gritos.
The xx, “Shelter”
Bem colocado, estava tudo pronto para o The xx. Quer dizer, por parte da platéia, porque a banda penou um bocado. Em mais um ineditismo do Coachella 2010, até o som apresentou problemas.
Os amplificadores chiaram o show inteiro, tirando a concentração da inexperiente banda, que já tinha bastante com o que se preocupar de frente para aquela multidão.
The roof is on fire
Quando o The xx começou a se soltar, o teto do palco principal teve um princípio de incêndio, desviando a atenção de todos. Tentando manter o espírito elevado, o baixista simplesmente disse “the roof is on fire”, arrancando gargalhadas (mas nada de “burn motherfucker, let the motherfucker burn”).
As músicas continuam lindas ao vivo e são muito bem executadas, tanto a voz da vocalista quanto as guitarras e o baixo tem pegada, só que falta pressão. O que não decepciona é a parte eletrônica e de programação.
O sujeito é um monstro na MPC, tocando dois samplers simultaneamente de uma maneira pouco usual, dedilhando-os como se fosse um piano.
O encerramento foi épico, com o “baterista” tocado o terror na combinação de batidas e um prato microfonado (com efeitos) sendo espancado ritmicamente pelo baixista.
Se falta chão pra banda, o caminho deve ser macio. Só a coragem de enfrentar um palco aberto com um som tão introspectivo (como foi bem dito na resenha do LA Times), mesmo sabendo que se dariam bem melhor em uma das tendas, mostra personalidade.
Hot Chip
A sequência de artistas do segundo palco só fazia o local inchar cada vez mais. Vieram Hot Chip, sempre sem convencer ao vivo, e MGMT, quando a quantidade de gente já estava insuportável.
A essa altura, o único lugar disponível para assistir o show era na praça de alimentação e mesmo assim através dos telões, que de tão distantes pareciam miúdos.
Com um bom som o MGMT melhora bastante no palco, pena que as músicas novas definitivamente não ajudam. E eles ainda inventaram de não tocar “Kids”, ousando demais.
De qualquer maneira, eram mais sinais das transformações do Coachella. Duas bandas que dois anos antes faziam shows nas tendas, sugando multidões nunca antes vistas no palco dois. Mudou o festival ou mudou o público, difícil afirmar, muito embora continue não se escutando esses grupos em toda parte.
Outra vaga cativa do Coachella é reservada para ao menos uma grande banda latina, afinal, estamos na Califórnia. Ozomatli, Café Tacuba, Los Amigos Invisibles, Manu Chao, Kinky, todos passaram por ali em algum momento. Esse ano foi a vez do Aterciopelados.
Aterciopelados
Os colombianos honraram a tradição de show bombásticos na tenda media e não se apertaram. Veteranos, sabem exatamente os atalhos do palco. Fecharam com “Baracunatana” e uma farta distribuição de frisbees de papel machê, entre mensagens de paz e amor.
No caminho para o Major Lazer deu tempo de ouvir o Devo tocando “Whip It”. A curiosidade falou mais alto, silenciando o bom senso e o trajeto até a outra tenda continuou, o que se provou um equívoco.
Vestidos com ternos sem nenhum propósito aparente, já que as vestimentas não tinham nada a ver com cenário e figurino dos outros integrantes no palco, a dupla soltou um festival de bases de gosto duvidoso, um despedício de boas referências (baile funk, tecnobrega, reggaeton, dancehall), cobertas por berros do MC, trechos de Ace of Base e outras maravilhas.
David Gueta tocava na tenda ao lado, se esforçando na farofa, hits de FM e mesmo assim perdeu a disputa. O histórico de más escolhas de atrações eletrônicas do Cochella continua.
Flying Lotus, “Idioteque” (Radiohead)
Graças ao bom Deus uma verdadeira higienização auricular veio em seguida. Pela segunda vez no festival, dessa vez o Flying Lotus teve muito mais destaque. As pessoas se acotevelaram para ouvir o hip hop experimental produzido por Steven Ellison.
As batidas instrumentais tem forte influência dos graves do dub, do clima soturno do trip hop e dos blips do EBM. Utilizando apenas um laptop e sem tirar o sorriso do rosto, ao vivo o Flying Lotus entortou ainda mais suas produções.
A frente de um telão, Steven adiciona camadas de elementos uma sobre as outras de uma maneira que demoram a se encaixar, até soltar o elemento unificador e que dá a liga ao groove. Foi assim com as músicas do seu segundo disco, “Los Angeles”, assim como as reconstruções de “Idioteque” (Radiohead), “Avril 14” (Aphex Twin) ou nos passeios pelo deep house ou drum n bass.
Uma das melhores apresentações do festival, coisa fina.
Dead Weather
Na saída, ainda deu tempo de pegar o finalzinho do Dead Weather, mais um projeto bacana do Jack White, que teve seus momentos minimalistas atrapalhados pelo que vinha do palco principal, a cargo do DJ Tiesto.
2ManyDJs
Botando a tampa, o 2ManyDJs reuniu alguns dos seus principais remixes e mashups num set perfeito em que o grande destaque foi o telão. Cada faixa ganhou animações próprias, com visual de capa de disco, se adaptando conforme as mixagens avançavam.
Betty Ditto cantava na capa de um disco do Gossip, assim como MGMT, Vitalic, Joy Division e todos os outros, sempre acompanhando as mixagens. O efeito prático foi um melhor entendimento, principalmente para quem não consegue identificar cada uma das músicas utilizadas, esquentando a relação com o público.
A tempestade de papel picado indicou o fim da festa. Era hora de partir pra casa e descancar para o último e mais promissor dia.
Dia 3: Enfim, Coachella Soft Pack, Local Natives, Rusko, Mayer Hawthorne, Florence & The Machine, Yo La Tengo, Spoon, Phoenix, Thom Yorke, Sly Stone e Gorillaz
Logo na chegada, notar que o campo de polo não mais parecia mais um formigueiro foi alentador, mesmo que pudesse ser pelo horário. O que parecia uma breve visão de tempos mais agradáveis do festival, se confirmou como o dia com mais cara de Coachella de todos.
Provavelmente muitas das pessoas obrigadas a comprar o passe para os três dias já estavam na estrada de volta pra casa a essa altura. Para contrastar com essa grande notícia, veio a triste informação de que o Hypnotic Brass Essemble havia sido cancelado.
Restou assistir o Soft Pack, legal, e o fraco Local Natives, mais um da barca do nu-folk, fortemente representada esse ano, salvando-se com a boa “Aeroplane”.
Enquanto isso, Rusko lançava dubstep em um dos cenários mais distantes daquele onde o estilo normalmente é tocado. No lugar de uma sala escura, com pessoas encasacadas, lá estava ele em plena luz do dia, as pessoas de chinelo. Uma mudança e tanto.
Mayer Hawthorne
Foi só quando Mayer Hawthorne apareceu que as coisas esquentaram, com sua músicas de baile de formatura inspiradas na Motown dos anos 50 e 60. O que poderia ser mera cópia se revela bastante criativo.
Se a voz não é exatamente avassaladora, dá conta da proposta, emitindo inclusive os falsetos do disco, coisa que o vocalista do Passion Pit não consegue chegar nem perto ao vivo. A banda de apoio, The County, é uma beleza.
Antes de “Maybe So, Maybe No”, Hawthorne contou que uma fã o perguntou no Twitter se ele iria tocar sua música favorita, aproveitando pra divulgar o seu endereço e pedir seguidores.
“Just Ain’t Gonna Work Out”, “Green Eyed Love” e até “Just A Friend”, do Biz Markie, foram mantendo o pique alto até Hawthorne sair com o público na mão e consagrado do salão.
Demorou bastante até a Florence & The Machine resolver dar as caras. O atraso somado a chatice que foi a primeira música foram a deixa para abandonar a menina e ir atrás do que realmente interessava.
Yo La Tengo, “You Can Have It All”
Há muito tempo atrás, houve um show do Yo La Tengo no extinto (e, quem diria, saudoso) Ballroom. Uma noite clássica, produzida por Rodrigo Lariú e que eu faltei. Mesmo sem ser um fã obsessivo do trio, ter perdido a chance de vê-los tão perto de casa foi uma mancada e tanto.
Anos depois, finalmente estava de frente com o Yo La Tengo. Como bem disse o Pedro, 50 minutos é muito pouco para uma banda com um repertório tão amplo, podendo ir do indie ao noise `a fofura em segundos.
Tentar fazer um show que cobrisse tantas nuances acabou prejudicando o YLT. Não tinha muita gente e a magnitude do palco principal piorou isso, uma pena, pois quem viu a coreografia de “You Can’t Have It All” (do George McCrae), feita a pedido do Sly Stone, segundo a banda, sabe o quanto foi sensacional.
Spoon
Do Spoon deu pra ver apenas cinco músicas, todas muito boas, num palco bonito, decorado com fios com lâmpadas incandescentes esperando o por do sol para serem acesas durante o show do Pavement. Assim que Jonsi, vocalista do Sigur Rós, liberou o palco, começou a corrida por um lugar para o Phoenix no Outdoor Stage.
Phoenix, “Fences”
Em nenhum momento durante a crise dos cancelamentos dos vôo na Europa passou pela cabeça a possibilidade do Phoenix não aparecer. Por isso, quando a banda entrou e contou que por pouco isso não aconteceu, mesmo já os vendo no palco, deu alívio.
Por conta das dificuldades de chegar aos EUA, a banda se apresentou sem seus iluminadores e desfalcada da decoração do palco, motivo pelo o qual eles pediram desculpas, falando que “a noite será apenas sobre a música”.
Phoenix
Provavelmente por decisão da banda, todas as luzes de palco estavam apagadas e o Phoenix se apresentou utilizando apenas algumas luzes brancas, em vários momentos coordenando a marcação, determinando de que lado para que lado deveriam ser acesas.
Era por do sol e a luz natural apenas intensificou a beleza de “Love Like A Sunset”, até no telão funcionou. Embora as vezes possa não transparecer nos textos aqui, sei exatamente o tamanho da sorte que é poder vivenciar momentos assim, e esse foi, literalmente, de chorar.
Phoenix
Enfileirando quase todas as músicas do “Wolfgang Amadeus Phoenix”, a banda fez até um bis (na verdade uma extensão do final de “1901”), coisa raramente vista no Coachella.
Em se tratando de shows, poucas coisas são melhores do que ver uma banda na turnê de um disco que você gosta. Num lugar desses, com esse visual e o astral da platéia lá em cima, todo mundo numa boa, não tem comparação. Clássico.
Não sei porque, não estava esperando muito desse show. De qualquer forma, a apresentação multimídia do Plastikman ficou pra um outro dia. Nada como baixas expectativas para gerar grandes surpresas.
Pesou também o fato de, com a rapidez das atuais mudanças tecnológicas, amanhã tudo parecer uma besteira. Acredito que o experimento interativo com iPhones e iPods tenha sido demais. Porém, se há dez anos atrás houvesse tido um show utilizando SMS, hoje imagino que não seria algo do qual me lembrasse com muita empolgação.
Soltinho no palco, Thom Yorke parecia estar curtindo bem mais do que nos shows do Radiohead. Talvez eu também. As referências, principalmente pela influências mais escancaradas do dub e da música eletrônica, deixam Thom menos indie.
Depois de tantas bolas fora do Red Hot Chilli Peppers, estava com preguiça, ou ao menos não muito empolgado, para ouvir o Flea tocar. Por isso, foi uma grande alegria ter tido novamente tanto gosto em ver o baixista tocar.
Contorcendo-se no palco no compasso dos slaps, Flea fazia o instrumento estalar como se estivesse no Primus e pesar como se fosse o Robbie Shakespeare, com linhas de baixo cavalares. Até melódica o cara tocou.
O percussionista brasileiro Mauro Refosco, do Forró In The Dark, tem participação crucial na sonoridade do show. É ele quem faz a quebradeira andar com um instrumentos de percussão totalmente brasileiro, injetando batidas do zabumba e o toque do berimbau.
Nigel Godrich, produtor dos últimos discos do Radiohead, e o baterista estava mais recatados, porém precisos.
Quem esteve no Coachella esse ano vai lembrar do vento que soprou forte todas as noites e vai reconhecer os shows só pelas imagens, lembrando da brisa batendo no rosto. Durante o Atoms For Peace, a ventania se intensificou, como se fosse uma reação a pressão que saía do palco.
A decoração toda baseada em tubos de luz, lembrava a do Radiohead, porem estavam na horizontal em vez da vertical, piscando freneticamente em vez de movimentos lentos, hora pintando o palco de verde, hora de azul ou verde.
Voltando ao Plastikman, tecnologia por tecnologia, tenho a impressão que ter visto o bis de Thom Yorke, sozinho no palco com o violão, construindo um arranjo utilizando um pedal de loop, vá ter mais valor, mesmo que apenas sentimental, do que uma interação via celular.
Ao apresentar a música, Thom falou: “essa vocês não devem conhecer, a não ser que você passe tempo demais no YouTube”, tocando num ponto interessante, sobre como a busca desenfreado por saber tudo o mais rápido possível pode arruinar grande surpresas.
Felizmente, nunca tinha ouvido a canção e fui arrebatado na hora. Não estar por dentro as vezes tem suas recompensas. Foi o show do festival.
Sly Stone
Outra surpresa, justamente no sentido oposto, foi o que aconteceu no show do Sly Stone. Após um quase adiamento e uma mudança de horário, o rei do funk soul foi uma das últimas atrações do festival a tocar. O que se viu foi umas das cenas mais tristes que já presenciei na música.
A passagem de som, sendo feita na hora, prometia. Só timbre bonito, o groove rolando, a banda pronta esperando seu líder. Eis que Sly Stone adentra o palco, fantasiado de policia, com uma peruca e uma boina que impediam ver o seu rosto.
Totalmente acabado, Sly mal se aguentava em pé. Totalmente perdido, com menos 10 minutos de “show”, perguntava no microfone quanto tempo fazia que estava ali. Os músicos, principalmente uma das integrantes do coral e os roadies, faziam de tudo para cena parecer normal. Era impossível.
Sem conseguir tocar nem metade de alguma música, Sly mudava de idéia no meio das canções, dava ordens a banda e ainda apresentou ao público seus constrangedores experimentos com eletrônica. Não dá pra entender que motivo$ permitiram uma lenda da música ter sido exposta dessa maneira, uma coisa realmente deprimente. Ele não merecia isso.
Na saída, ainda deu pra conferir o final do Gorillaz, “Clint Eastwood” e “Feel Good”. Mesmo com uma banda grande no palco e cenário grandioso, Damon Albarn e sua turma pareciam xoxos e sem força, sem justificar a moral de encerrar o festival.
Exausto, restava finalmente dormir, feliz, sem nem pensar em tanta coisa ficou de fora, praticamente um outro festival (A bagunça do Club 75, Miike Snow, da turma da Ed Banger com um dos integrantes do Justice, Deadmau5, Pavement, Specials, PiL, Erol Alkan, La Roux, Faith No More, Raveonettes, Dirty Projectors, Little Boots, Plastikman, Mutemath, Julian Casablancas…).
Cultura digital, música, urbanidades, documentários e jornalismo.
Não foi exatamente assim que começou, lá em 2003, e ainda deve mudar muito. A graça é essa.