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quinta-feira

25

março 2010

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Anotações de viagem: Vietnã

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Saigon lembra muito Sao Paulo. É uma metrópole frenética, com um trânsito absurdo e motos, muitas motos. Atravessar uma rua é uma aventura, pois há poucos sinais e você tem que encontrar um espaço entre as motos e começar a caminhar. Os motoristas estão atentos e desde que você não mude o passo ou de direção, vão desviando.

Ao contrário da Índia, no Vietnã os motoristas são cautelosos. Utilizam as calçadas como uma extensão das pistas e fazer contramão não é raro, no entanto, na Índia a lógica de direção é totalmente invertida.

Na Índia, em vez de partir de 0km a 100km, o raciocínio é estar sempre a 100km, utilizando o freio pra ajustar a velocidade quando necessário, é a principal ferramenta do veiculo. Ao menos no Vietnã, segue-se as regras de todo mundo, de acelerar com cuidado.

Ho Chi Minh, nome oficial de Saigon, não é tão tumultuada como vários guias alertam. Fala-se muito de assaltos, batedores de carteira, crianças de rua abrindo sua mochila ou bolsa sem você perceber e de pedintes. Apenas um dia circulando pela cidade, sempre a pé, pode ter sido pouco, porém o fato é que nada disso aconteceu, nem mesmo os pedintes foram vistos.

As atrações mais interessantes da antiga capital do Vietnã capitalista, base dos EUA durante a invasão, são os museus dedicados ao conflito. Chamada de Guerra dos EUA pelos vietnamitas, a vitória dos comunistas do norte sobre o sul capitalista é motivo de orgulho nacional, conhecida como a grande reunificação do país, após mais de um século de colonialismo francês, japonês e da própria invasão americana.

Como no Camboja, a guerra também se transformou em um bem turístico. Para evitar o clima pesado, é uma boa evitar o museu da guerra e seu registro gráfico dos conflitos. O Palácio da Reunificação é uma visita mais leve e ainda assim instrutiva sobre os mesmos fatos.

Sede do governo do Sul, o prédio foi mantido exatamente como estava no dia 30 de Abril de 1973, quando um tanque do exército do norte arrombou seus portões, pondo fim na guerra e selando a vitória do regime comunista, até hoje a frente do pais. É um túnel do tempo, com objetos e decoração da época, incluindo mapas táticos.

A quantidade de turistas sexuais pelas ruas é nojenta. Senhores de idade acompanhados de jovens e nem tão jovens vietnamitas, sempre com expressões tristes ou no minimo entediadas no rosto. Os sujeitos não se dão ao trabalho nem de tentar disfarçar, freqüentando todos os lugares mais visitados por turistas, como se isso fosse parte natural de uma viagem ao Vietnã.

É lamentável o senso moral de pessoas que não hesitam em explorar a miséria alheia. Não precisa ir muito longe pra se ver isso, uma voltinha pelo calçadão de Copacabana também produz imagens parecidas.

As conhecidas pagodas chinesas de Chinatown também não despertaram muita empolgação. Mal cuidadas, escuras e com pouca informação, não são lá muito atrativas.

De Saigon saem passeios pelas redondezas, como My Tho e Ben Tre, há duas horas da cidade. Escolher a agência mais barata e conhecida da cidade, Sihn Cafe, foi um erro. O passeio é focado em turistas pouco exigentes.

O passeio é cheio de armadilhas (toda “atracão” envolvia comprar alguma besteira, de bala de coco a mel e artesanato de má qualidade) e um guia metido a engracadinho. Ainda assim, conhecer a vila de Ben Tre de charrete, mesmo sem ser rústica como prometido, e principalmente o rápido passei de barco por um canal no rio Mekong valeram a pena. A chuva que caiu o dia todo ajudou a dar um clima.

A chegada a Danang, na região central do país, foi desanimadora. Continuava chovendo e fazendo dias feios, o que não estava ajudando muito o Vietnã a se tornar um dos destaques da viagem. O povo não é muito acolhedor e a verdade é que grandes centros urbanos não são o meu ideal de destino turístico.

Por isso, dar de cara com Danang, uma cidade pequena mas sem charme nenhum, um lugar qualquer perdido no Vietnã, deu uma desanimada. O grande atrativo da cidade é estar perto de Hoi An, uma cidade ainda meno, só que com o apelo de ter conseguido manter ao menos parte da sua herança historica, repleta de pagodas e construções remanescentes dos tempos de Indochina.

A conclusão lógica foi pular Danang e ir direto para Hoi An. Mesmo na alta temporada não havia turistas suficiente pra encher seus muitos hotéis, restaurantes e cafés com caras de empreitada de europeu. Complicado entender como fazem pra se manter lucrativos.

O melhor de Hoi An é alugar uma bicicleta e pedalar a esmo, conhecendo as pontes e templos que pintam pelo caminho sem muita obrigação de ver tudo.

Mesmo com tantos restaurantes, a melhor pedida foi comer numa esquina em que várias barracas de comida típica dividem o espaço sob uma lona. Foi uma das melhores refeições de toda viagem pela Ásia, e também a mais barata.

O segundo almoço por lá foi inteiramente dedicado a conceitualizar um restaurante no Rio que seguisse exatamente as mesmas regras de comida vietnamita tradicional, sem invencionices. Um lugar simples e barato, num ambiente como aquele: balcões de madeira compartilhados, guardanapos que saem como papel higiênico, uniformes iguais aos dos locais, tudo com cardápio assinado pela cozinheira da barraca número um, Ms. Lan.

De brinde, com a conta o cliente receberia uma nota de 1000 Dongs, a moeda local, equivalente a alguns centavos. Um dia, quem sabe…


URBe? Hahaha!

Na ida de Hoi An para o aeroporto estavam as Marble Mountains, conjunto de cavernas que escondem templos e, no passado, tesouros. Sem esperar muito, a bizarrice do lugar surpreende. Um tanto sombrio, as vezes macabro, os templos parecem algo saído do cenário do “Goonies”.

A última parada foi em Hanóis. O motivo principal é que de lá saem os barcos para passear pela Halong Bay, arquipélago com mais de duas mil ilhotas.

O passeio parte bem cedo, saindo de um porto a quatro horas de Hanoi. A bordo do Emeraude, os dia e a noite foram pura regalia. Almoço, jantar e café caprichados, sessão de “Indochina” a noite e uma visita a uma caverna fantástica.

O tempo passou rápido e logo estávamos de volta a Hanoi para aproveitar a única tarde e noite que teríamos na cidade, dando tempo suficiente para visitar o mausoléu e o museu do Ho Chi Minh.

quarta-feira

10

março 2010

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Anotações de viagem: Camboja

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A chegada ao Camboja engana. A recepção fria e seca dos militares assusta e não passa uma imagem fiel do país ou de seu povo.

Preocupados apenas em coletar o dinheiro dos vistos, os responsáveis pela função dão atenção especial para tarefa de sobretaxar o valor de 20 dólares, arredondando para cima o que ja é redondo, roubando 5 dólares por turista. O lucro é alto agora que o pais é bastante visitado.

Pra completar, a taxa de saída são mais outros extorsivos 25 dolares, mais do que se cobra pra entrar!

Tal comportamento não chega a ser surpresa num país conhecido por uma guerra civil recente, quando o sanguinolento Khmer Vermelho dizimou a própria população com o apoio dos militares. A paz é ainda muito nova.

Apesar de descarado (o valor real do visto fica a mostra num luminoso e vem carimbado no passaporte), nem passa pela cabeça reclamar do golpe. Atrás do guichê ficam um dezena de militares: um para pegar o passaporte, outro pra levar, um terceiro pra receber o dinheiro, outro pra dar o troco, mais um pra devolver o documento… Melhor não, deixa pra lá.

Uma vez dentro do Camboja, descobre-se um povo muito amigável, educado, solícito e organizado. As ruas são limpas, diferente do que se espera encontrar em um dos países mais pobres da Ásia. Os hotéis e bares, principalmente em Siam Reap, são arrumados e contemporâneos, provavelmente pertencentes a europeus ou cambojanos repatriados.

As pessoas são alegres, brincalhonas e mesmo os pedintes ou vendedores de rua não são tão insistentes como na Índia ou Tailândia (tirando os de Angkor Wat, batendo recordes mundiais, podendo ser considerados chatos até pelos indianos).

Outra grande surpresa são os preços. O Camboja não é barato. Seria exagero dizer que é caro, mas é bem mais caro do que os seus vizinhos. Nada custa menos de 1 dólar e geralmente as negociações de coisas pequenas começam logo em 2 dólares, valor mágico nas ruas.

Parte da culpa é exatamente o dólar ser a moeda oficial do comércio, encarecendo tudo ao arredondar valores. São preços irreais, que não condizem com os custos do pais, mesmo considerando-se que o Camboja não possui indústria e quase tudo é importado. Eles cobram o que você pagaria em qualquer outra cidade, o que não é a matemática correta em nenhuma economia.

Nas duas principais cidades, a pequena Siem Reap ou a capital Phnon Penh, os motoristas de tuc-tuc ou de motos (transporte muito utilizado, levando até três pessoas) não sabem o nome das ruas ou onde fica nada. E não se trata de golpe, uma vez que o preço é fechado e eles perdem tempo e combustível com a confusão.

Na noite que chegamos em Phnom Pehn, a ida ao melhor restaurante da cidade foi uma saga. Era perto do hotel, havia um mapa com o local marcado, além do endereço. O motorista se perdeu, ninguém sabia informar como chegar e foi tanto desencontro que saímos andando, sem nem pagar pela corrida.

Ao ligar para o restaurante de um outro lugar, o próprio dono foi nos buscar de moto. Era numa esquina das duas principais ruas da cidade, a entrada marcada com um luminoso gigante.

O melhor de andar por Phnom Pehn e caminhar de um templo para o outro, observando a vida local. Os meninos fazendo altinha com peteca, as meninas com raquetes, e gente de toda idade dançando em grupos numa grande praça.

No final de tarde, diversos aparelhos de som são montados pela praça. As velhinhas fazem aulão de aeróbica, os jovens criam e executam coreografias para sucessos do pop internacional, sendo seguidos por quem quiser chegar junto. Difícil é não participar, já que se você fixar olhando muito será convidado a se juntar.

Os campos de extermínio do Khmer Vermelho são para muitos a grande atracão da cidade. Todo motorista vai propor uma corrida pra lá (também pela distancia, é claro) e o local é sempre citado em panfletos e sugestões de passeio. Tô fora desse tipo de visita baixo astral. Fui a Dachau uma vez, contrariado, pra nunca mais.

Em todo caso, levanta a mão quem não ouviu falar do Camboja justamente pela guerra civil, Khmer Vermelho, as minas terrestres, a legião de amputados… Talvez por serem recentes, esses fatos são comentados muito mais até do que os templos de Angkor Wat.

Goste ou não disso, são um dos pontos de venda do pais como destino turístico. A quantidade de livros sobre o regimes suas atrocidades disponíveis na loja de livros do aeroporto confirmam que essas histórias são também um amargo souvenir.

Deve ter sido isso que o ministro haitiano queria dizer quando declarou que o terremoto avassalador seria bom para o pais. É uma desgraça sem tamanho, mas colocara o país no mapa e no centro da mídia até mais do que sua própria guerra civil. Isso pode trazer apoios governamentais, ONGs, etc.

Taí o Camboja pra provar. Sem falar na adoção de crianças orfãs por famosos, a moda da vez.

Na estrada de Phnon Penh para Siam Reap dá pra ver um pouco do lado rural do país. Dentro do ônibus, a usual hospitalidade cambojana: lanchinho, explicações num inglês esforçado que você não encontra, por exemplo, na Tailândia, e sorrisos.

O povo do Camboja é generoso. Todo lugar que você sentar te oferecem água, se você comer lhe dão frutas ou alguma sobremesa local sem cobrar por isso. Além disso, como os brasileiros, fazem piada e se zoam sem parar, estão sempre rindo.

Mesmo quando uma barganha deixa um vendedor bravo – eles não gostam muito do esporte – uma piadinha qualquer arranca risadas e zera qualquer mal entendido.

A área por onde se espalham os templos de Angkor é enorme, por isso fretar um tuc-tuc é indispensável e ter um guia, aconselhável. O total não é barato: 20 dólares para entrar, 15 pelo tuc-tuc e 25 pelo guia. Os dois juntos agilizam o passeio, possibilitando ver o essencial em um dia. Para se ver tudo, aconselha-se três dias.

O parque é muito bem cuidado e as construções impressionam pelo tamanho e principalmente pelos detalhes. Templo hindu transformado em budista, Angkor foi saqueado durante guerras, depredado por vândalos e fanáticos religiosos hindus, que rasparam o rosto dos budas talhados nas paredes de pedra e destruíram estátuas.

Durante seu regime Maoísta, o Khmer vermelho destruiu os mais de 3 mil templos budistas do país e matou milhares de monges, considerados parasitas. Felizmente, deram pouca atenção a Angkor, apesar dos buracos de bala na parede. Ainda bem. Podia ter sido bem pior.