quarta-feira

20

outubro 2010

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Transcultura #023 (O Globo): mario maria, Flavors.me

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Texto da semana retrasada da coluna “Transcultura” que publico todas as sextas no jornal O Globo:

Música lo-fi
Banda de um homem só, Mario Maria lança disco com jeito de rascunho
por Bruno Natal

A capa do único EP do Mario Maria, “All the way to professora Núbia”, disponível apenas em formato digital, não existe. Não que o disco não tenha capa, porque tem: uma foto antiga de uma senhora (será a professora Núbia?) em frente a jarros de plantas, com o título grafado em uma fonte sem nenhum apelo gráfico. O que não há é um arquivo em alta definição, para impressão em jornais e revistas, ou mesmo um encarte. Não podia estar mais em sintonia com o espírito lo-fi do projeto.

– A foto original até é em alta, mas fui fazendo a capa gerando imagens na própria tela do computador, no Word. Então a qualidade se perdeu – explica Mario, cujo real sobrenome é Cascardo.

Mario não tem uma Maria. Ele é o único integrante da “banda”, toca e grava todos os violões, teclados, vozes e ruídos lo-fi. A onda é simplificar. Desde que descolou um computador que permitisse fazer tudo isso em casa, melodias, trechos já usados em bandas anteriores e composições para violão começaram a tomar forma e a se transformar em músicas que, em comum, tinham o fato de serem feitas sem saber bem no que iriam dar.

Hoje em dia, todos são artistas, ao mesmo tempo que ninguém é artista. As pessoas soltam suas obras na rede para ver o que acontece, simplesmente para se expressar. Carreiras podem ou não acontecer. É pura consequência. Nesse contexto, Mario Maria é um típico exemplo da forma como a música independente circula atualmente, grande parte em forma de rascunhos, divulgados antes de finalizados. É um grande ensaio aberto, no qual a baixa qualidade, ao mesmo tempo que pode prejudicar o resultado final, gera curiosidade.

Em tempos de Pro Tools e do afinador Autotune deixando muitas gravações perfeitas demais, a opção de Mario foi pelo Garage Band, programa pré-instalado em todos os computadores da Apple. Cada falha é explorada e transformada em opção estética, a baixa qualidade sonora transformada em proposta. O som do violão vem e vai, a voz treme, ruídos ambientes passam a fazer parte da composição. Tudo isso soaria terrível, se não fosse um processo cuidadoso.

– O principal dessa sonoridade é o microfone, que é o que vem embutido no computador. Ele não é direcional e nitidamente não capta com muita definição. Quando você junta duas ou mais trilhas, os ruídos aparecem, sem dó. As músicas são exportadas direto em mp3. Nem eu tenho arquivos de melhor qualidade de todas as músicas – explica Mario. – Do lado pessoal, é continuar gravando quando está rolando uma obra ao lado, como em “Quissamã rules”, quando o telefone toca, quando alguém fala. É querer gravar transitando pelos lugares. A sonoridade lo-fi é causa e consequência desse processo experimental.

Em “Eclipse”, umas das sete faixas do recém-lançado EP, o sujeito repete versos inteiros de “Lua de cristal” (da Xuxa), oferecendo outra leitura aos versos “Tudo que eu quiser/Eu vou tentar melhor do que eu já fiz /Esteja o meu destino onde estiver/Eu vou tentar a sorte e ser feliz”.

De alguma maneira torta, essa excentricidade faz sentido na sua proposta. As apresentações ao vivo ainda são raras e foram poucas. Num projeto em que o som ambiente é tão importante nas gravações, a maior dificuldade é transpor o processo orgânico para o palco, sem uma banda e conseguindo integrar os sons de cada lugar às músicas.

Mesmo formado em comunicação, cursando mestrado em cinema e trabalhando como câmera em produtoras de vídeo, o primeiro clipe (“Shine, Levine” e seu assobiozinho grudento) dispensou recursos mais elaborados e foi feito em compasso com o disco.

Numa espécie de artesanato digital, Mario convidou amigos para uma festinha em casa, usou o computador como saída de áudio e câmera, gravou um plano-sequência da transmissão pelo ustream.tv e finalizou o clipe. Ainda assim, ele garante que o Mario Maria é um projeto levado a sério, independentemente de se vai vingar ou não.

– Gasto energia, mas atualmente não há muita regularidade ou disciplina. Mas isso pode mudar. A música me acompanha porque eu não faço questão de esquecer as melodias que me surgem e em algum ponto tenho vontade de gravá-las. Então, é sério, ainda mais pensando que isso chega a outras pessoas. Acho que vingar é poder manter isso enquanto fizer sentido pra mim. Mas não penso em ter a música como ganha-pão.

Tchequirau

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