sexta-feira

23

agosto 2013

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De paraquedas no Lolla Chicago 2013

Written by , Posted in Destaque, Música, Resenhas

Sem nunca ter planejado conhecer o festival, fui parar no Lollapalooza 2013, no início de agosto, por acaso. Em viagem de trabalho, acabei indo para Chicago um dia antes do início do festival para uma reunião, pintou ingresso e lá fui.


Cloud Gate

Foi uma grata surpresa, mesmo que já tivesse ouvido falar bem tanto do festival quanto da cidade. Chicago, do pouco que deu pra ver, é bem interessante. Só de ter finalmente conhecido o Cloud Gate, instalação de Anish Kapoor, apelidada de feijão prateado para desgosto do autor, já teria feito valer a visita. Teve mais.

Bem diferente, por exemplo, do Coachella, o Lolla é totalmente urbano. Em vez de uma ida para o deserto, num festival onde essencialmente todos frequentadores estão viajando, o Lolla acontece num Grant Park, incrustado no meio da cidade.

O Grant Park não possui apenas uma entrada ou saída, ladeado por um lago, três avenidas o cortam verticalmente e três ruas horizontalmente. Todas ficam fechadas ao trânsito de carros e a cidade segue funcionando normalmente. Nessas condições, a tradicional qualidade produção e organização de eventos dos EUA impressiona ainda mais.

A maior parte do público é local ou das redondezas e a facilidade de se chegar e ir da área do evento para o hotel simplesmente atravessando a rua dá outra atmosfera ao Lolla, mais corriqueira e menos exclusiva. Mesmo que isso não queira dizer necessariamente que seja pior, a praticidade também atrai muitos desavisados e aquela galera atrás de outra coisa que não música.

Com os dois palcos principais colocados um em cada ponta do parque, caminha-se bastante. Ao longo dos dias (conferi os dois primeiros, perdi o terceiro) isso acaba interferindo nas decisões sobre o que assistir.

Dia 1
Jessie Ware, Atlas Genius, Theophilus London, Disclosure, QOTSA, Lana Del Rey


Jessie Ware

Tocando no palco mais próximo a entrada que utilizei, Jessie Ware comandava uma maciota vespertina. Ao ar livre, numa concha acústica com piso de concreto, funcionou agradevelmente como trilha para final de tarde. Num fechado, a noite, deve ir melhor, embora nesse contexto talvez os arranjos sejam lentos demais.


Atlas Genius

De lá para o fenômeno do mês. O Atlas Genius cozinhou até o final os que aguardavam a banda tocar “Trojans”, seu hit radiofônico. De resto, nem ruim, nem bom. É mais do mesmo, outra banda de pop rock com batidas disco. Aguado demais, tem quem faça melhor.


Theophilus London

Em mais uma confirmação de que show de rap com banda eleva a coisa alguns graus, Theophilus London fez uma apresentação animada e dedicou ao Brasil sua música chamada “Rio”.


Disclosure

Um dos nomes mais incenssados na música eletrônica atual, com disco de estreia chegando ao primeiro lugar na parada inglesa, o Disclosure lotou o elameado palco The Grove e demonstrou a força da “EDM” (electronic dance music) nos EUA. Em plena luz do dia a molecada fritava de MD e quicava a cada virada.

Não apenas “Latch” e “White Noise”, como todas as outras músicas foram cantadas de ponta a ponta. Quem mesmo estando nas redondezas não cantou foi Jessie Ware, que contrariando expectativas não apareceu para repetir ao vivo a parceria com a dupla em “Confess To Me” ou o remix deles da sua “Running”.

Os irmãos Howard e Guy Lawrence fazem uma apresentação correta e muito boa tecnicamente. Mesmo tocando bateria, baixo e fazendo os vocais ao vivo, falta uma pressão pra fazer daquilo um show propriamente dito e não uma mera reprodução do disco. Pode ser também culpa das próprias composições.

O nível de produção é alto, caprichado, porém ao ouvir as 18 músicas do disco de estreia ou um show de 40 minutos, fica claro que as ideias não variam muito. Estruturalmente as músicas são bastante parecidas e isso pode ter a ver com a velocidade com que se viram obrigados a lançar um disco. Com mais tempo de estrada as coisas tendem a melhorar.

Certamente assistir isso num cenário de noite faz bastante diferença. É música pra pista, pra dançar, não pra olhar.


QOTSA

Hora de uma indagação (e de botar o capacete para me proteger das pedradas) pra resumir o show do Queens of the Stone Age.

A banda é mesmo muito boa e os hits comprovam isso, porém é também inegável que o sucesso veio a reboque de uma abordagem mais pop. Fica a pergunta: se a discografia do QOTSA fosse iniciada apenas a partir de “Songs For The Deaf” a banda gozaria do mesmo respeito?

Durma com essa.


Lana Del Rey

Repetindo a legenda da foto no Instagram, não é que ao vivo a Lana Del Rey segura a onda? Quem diria. É um belo show e não apenas porque a banda segura bem, mas porque ao vivo dá pra entender a relação da Lana com suas fãs. Encantandas, as meninas (maior parte do público) ouvem as canções como diários psicografados. É de menina pra menina e Lana nem tenta esconder isso. Como uma rainha hipster, ao mesmo tempo que mantém uma pose cool e de diva, troca com as fãs como se tivessem no whatsapp.

Dia 2
Charles Bradley, St. Lucia, Unknown Mortal Orchestra, Foals, Kendrick Lamar, Steve Angelo, Nine Inch Nails, Postal Service


Charles Bradley

O sujeito é demais, vozeirão, presença de palco, com uma banda azeitada pra fazê-lo brilhar. O que atrapalha é o exagero na deferência a James Brown (existe exagerar nisso? bom, existe, mesmo que Charles tenha sido um cover do godfather), o que torna o ato em algo um tanto caricato, beirando o pastiche. E mesmo assim vale a pena.

Não há, no entanto, como não deixar de pensar nos mecanismos da retromania. Assistimos Amy Winehouse, Mark Ronson, Mayer Hawthorne homenagearem o soul, a Daptone fazer (res)surgir Sharon Jones para uma nova geração, James Brown morreu. E agora, para onde ir, o que oferecer para um público ávido por referências históricas?

Descobrir e lançar um artista com características semelhantes e, melhor, com idade e história pra contar, pode ser visto como o ápice do retrô. O produto perfeito, melhor que qualquer releitura. Apesar do seu talento, é nesse espaço comercial que Charles Bradley parece ter sido encaixado.

Agora, se você perguntar pra ele, pouco importa. Suando em bicas e aproveitando cada minuto em cena, Bradley comprova por tabela o que muitos já desconfiam. Não tem cópia pra superar os originais (e essa frase ficou sim propositalmente ambígua, tire suas conclusões).


St. Lucia

O St. Lucia mostrou no palco porque estava tocando pra quase ninguém. É tanto clichê hipster empilhado, o som é sub tanta coisa que é um show que você esquece enquanto está assistindo. Absolutamente nada é memorável.


Unknown Mortal Orchestra

Sem conhecer o disco e apenas seguindo dicas de amigos, ouvir o UMO ao vivo foi uma experiência supreendente. Chapado, garageira com cara de jam de ensaio, a guitarra dobrada atochada de reverb, delay construindo células setentistas que desembocam nuns solos quase progressivos, o som não era nada do que haviam dito.

Intrigado, fui ouvir o disco e confirmei: a banda endoida ao vivo num ponto que as música ficam irreconhecíveis. No lugar das viagens delicadas de “So Good At Being In Trouble” ou “Swim and Sleep”, uma psicodelia meio acelerada e barulhenta demais pra voar.

Ou não foi nada disso e faltou ouvir o disco antes do show. Pra saber, só quando a banda pousar por aqui, coisa que os integrantes disseram querer fazer no início do ano que vem.


Foals

Não sou conhecedor do Foals, mas gosto tanto de “Spanish Sahara” que, tendo a chance, vejo o show. A banda tem uma onda bem particular, de maneira que mesmo sabendo o nome de apenas uma música, não é difícil mergulhar e gostar de todo o resto. No pôr-do-sol ajuda também.


Kendrick Lamar

O show do festival de acordo com algumas pessoas, Kendrick Lamar tomou conta do Lolla. Como se todas as músicas do disco fossem sucessos de rádio, não teve momento baixo, foi em cima o tempo todo. A banda, completinha, reproduzia as bases de “Good Kid, M.A.A.D City” de maneira primorosa.

Dono do palco, Kendrick improvisa bem na interação com o público, promovendo uma corrida de carreira de rodas surfando sobre o público e transformando esse momento em um discurso sobre o simples fato de estarmos todos ali, extravasando as frustrações do dia-a-dia, do trabalho, etc (dá pra assistir no YT).

Kendrick opera no modo good vibes e só isso, a falta de carranca, torna a experiência algo muito mais agradável.


Steve Angelo

Se no primeiro dia o pequenino show do Disclosure pareceu dar a dimensão de a quantas anda a música eletrônica nos EUA, bastou uma visita a tenda eletrônica do Lolla pra ter a exata noção. O espaço gigantesco era um evento a parte, com telões, pirotecnias e a molecada derretendo.

A julgar pelo sucesso de produtoras como a Insomniac e do Electric Daisy Carnival, o foco comercial de um festival desse porte pode estar no lugar errado, ou no tempo errado.

A fórmula de todos os DJs ali era a mesma: contrução de momentun por dois minutos, drop down e estouro, repetir. E a cada estouro, as vezes acompanhados de explosões. É bem repetitivo, porém funciona. Não é difícil imaginar porque aquele mar de jovens não estava muito interessado no clima soturno oferecido pelo Nine Inch Nails alguns metros dali.

O palco eletrônico era o que permanecia lotado de maneira mais contínua, praticamente a todo momento. Sabendo que o Lolla tem a quantidade de anos e edições que tem, faz refletir se o destaque para o rock e bandas independentes não é mera curadoria, quase um capricho ou pura insistência num gosto pessoal dos produtores – não é o caso, a lotação esgotada comprova.


Postal Service

Na saída, ainda deu tempo de ver um pedacinho do Postal Service antes de ir embora para conferir o set do Baio, baixista do Vampire Weekend, num bar em outra área da cidade. Isso já é outra história.

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