quarta-feira

11

janeiro 2006

8

COMMENTS

A viagem da Céu

Written by , Posted in Resenhas

ceu_hpp2006.jpg
Céu
foto: Joca Vidal

A segunda semana do Humaitá pra Peixe começou com um problema, causando o atraso no ínicio dos show de Leleo e Céu. A mesa de som queimou faltando uma hora para o evento e teve que ser substítuida as pressas. Nada muito grave, considerando a conhecida pontualidade carioca. A demora serviu para aumentar a ansiedade do público que lotou o Sergio Porto para conferir a paulistana Céu, apontada como revelação da nova MPB.

Às 20h05, Leleo (ex-integrante da Banda Bel) abriu a noite com um show morno. Penando pra acertar o som durante a apresentação (devido ao problema com a mesa), seu “samba-rock progressivo” não decolou. Emulando Jorge Ben, tanto na sonoridade quanto na temática das letras (e tome nome de mulher!), as músicas seguiam a mesma estrutura de verso-refrão -repetição de um tema e/ou frase no final. Talvez a intenção fosse induzir ao transe, porém isso apenas tornou as músicas parecidas demais entre si.

Nem o sucesso, de sua autoria, “Solteiro no Rio de Janeiro”, em versão mais lenta, levantou a turma, ainda que o público estivesse prestando atenção durante todo o show. A tarefa não era mesmo das mais fáceis. A maior parte do público estava lá para ver a estréia carioca da Céu.

Quando chegou sua vez de encarar a platéia, a cantora pareceu tímida. Encolhida, se escondendo nas sombras e falando tão baixo entre as músicas que mal se ouvia a moça, Céu demorou um pouco para se soltar. Depois de elogios à cidade, algumas músicas e uns poucos problemas técnicos na primeira metade da apresentação, Céu e banda relaxaram e subiram de produção, como se guardassem propositalmente o melhor para o final.

A bonita voz de Céu sai fácil, tem bom alcance e projeção. Não decepcionou. Pelo contrário, ao vivo, seu timbre não lembra tanto o de Maria Rita, como no disco, o que por si só é uma boa notícia — duas cantoras, duas vozes diferentes. No quesito inovação musical, infelizmente, o mesmo não aconteceu. A banda, formada por Guilherme Ribeiro (teclados e efeitos), Lucas Martins (baixo e guitarra), Sérgio Machado (bateria), Bruno Buarque (percussão) e pelo DJ Marco é tecnicamente impecável, principalmente a cozinha. No entanto, ousa muito pouco.

Se a proposta é dar um passo a frente na sonoridade MPB, de maneira geral isso não acontece. Os arranjos soam parecidos com o que já foi feito. Tirando os scratches e efeitos eletrônicos, disparados de um laptop pelo tecladista — alguns um bocado gratuitos — o som não é diferente, por exemplo, da escola da Bebel Gilberto. Claro, é grooveado, tem nuances de trip-hop e atmosferas viajantes, mas cada virada, cada nota, parece tão precisa e calculada para soar “cool” que perde espontaneidade. O resultado é frio.

Céu não apenas interpreta como também escreve boa parte do seu repertório, abrindo espaço aqui e ali para versões, como “Nanã”, do mestre Moacir Santos. Outra versão, de”Concrete jungle”, do Bob Marley, foi responsável por um dos melhores momentos do show, seguida de perto por uma levada afro-beat, perto do final, em que a banda, finalmente, se soltou e se permitiu crescer junto com a voz da menina, fazendo uma diferença positiva no clima não apenas da platéia, mas também no palco.

Com os medalhões da MPB passando da casa dos 60, há um desespero para encontrar novos ícones para manter essa tradição musical brasileira. O caminho pode ser o traçado por Maria Rita, que, se não inova, ao menos renova o gênero ao procurar parceiros de sua própria geração (como Marcelo Camelo ou Rodrigo Maranhão). Pode ser também a fusão com a eletrônica. E pode não ser nada disso.

Na tentativa de antecipar a MPB de amanhã, qualquer respiro não rock pode ser considerado a salvação. Uma precipitação — e pressão — que não ajuda em nada o processo evolutivo e, principalmente, artístico da nova geração. Não custa lembrar, Caetano, Gil e outros, apesar do sucesso de crítica, não tiveram vendas expressivas até 10, 15 discos depois da estréia. Resta esperar que nomes atuais também tenham essa chance.

No camarim, após o show, Céu recebeu a visita dos colegas famosos (Moska, Mart’nália, Caetano Veloso) e escutou Caetano setenciar que ela “é o futuro”. Devagar, não é bem assim. O talento é inegável e a direção escolhida está correta, mas a pressa de chegar pode atrapalhar o percurso. Como dizem por aí: não interessa o destino, o importante é a viagem. A da Céu está apenas começando.

Deixe uma resposta

8 Comments

  1. ACM
  2. Lonha
  3. Renata Penna
  4. Edson Segundo

Deixe uma resposta para Edson SegundoCancelar resposta