Texto na da semana passada da “Transcultura”, coluna que publico todas as sextas no jornal O Globo:
Um bate papo entre Mahmundi e Castello Branco
Com discos recém-lançados, os dois jovens artistas conversam sobre motivações, processos de gravação e até religião
por Bruno Natal
Parte da mesma geração de músicos no Rio, Marcela Vale e Lucas Castello Branco tomaram caminhos diferentes. Ex-técnica de palco do Circo Voador, Marcela rebatizou-se de Mahmundi e fez sucesso com sua “Calor de amor”, synthpop oitentista inspirado tanto em Marina quanto em Toro Y Moi, que lhe rendeu o status de “hit do ano” no último prêmio Multishow. Lucas deixou os tempos de rock à frente do R.Sigma pra trás, enveredou pelo violão da MPB e tornou-se apenas Castello Branco. Mahmundi acabou de lançar seu segundo EP, “Setembro”, enquanto Castello Branco botou pra jogo sua estreia solo, “Serviço”. Convidei os dois para trocarem ideias sobre seus discos, motivações, religião.
Castello Branco: O que este EP significa pra você?
Mahmundi: É mais um passo do trabalho que ainda venho tentando estabelecer. Estou procurando filtrar os lados artista, musicista e cantora. São muitas coisas pra fazer, muito trabalho, estudos. Caminhar e aguardar é o melhor a se fazer.
Mahmundi: E como é expor coisas tão íntimas no disco, como essa questão de ter crescido num monastério?
Castello Branco: Quando você esconde o seu íntimo, esconde o que tem de mais precioso. Por muito tempo achei que o melhor seria não me expor, mas com isso fui tendo cada vez mais medo. Hoje sei que o medo não existe no amor.
Castello Branco: Como foi o processo para você neste EP, na composição e gravação?
Mahmundi: Este disco foi mais solto, o primeiro EP foi feito na correria e produzido na velocidade da luz. Este foi mais relaxado. Fui fazendo músicas e juntando boas composições para colocar nelas de maneira mais lenta. No fim, tinha muitas opções, com novas ideias de guitarras e tudo mais.
Mahmundi: Você, assim como eu, é um artista que existe com a força da internet. Como tem sido essa tarefa de gerenciar este momento pós-disco e o trabalho na rede?
Castello Branco: Tenho reservado um tempo só para receber das pessoas o que este disco trouxe a elas. Entender esse “pós-disco” é saber a necessidade do próximo passo.
Castello Branco: Qual é a sua relação com a linguagem eletrônica e a sua companheira de seis cordas, que sei que você ama?
Mahmundi: Quis botar a guitarra na jogada. Gosto muito de synths, aprendi a domá-los e fazer canções com eles, mas gosto de guitarra, fico entusiasmada de tocá-la. É meu segundo instrumento, depois da bateria. Tenho comprado pedais, lido muito mais e testado.
Mahmundi: Você já teve uma banda aclamada pelos indies. Como é recomeçar o processo?
Castello Branco: Não é uma continuação. Diferentemente do que muitos esperavam, não dei um passo à frente no processo. Dei um pra trás, em direção a mim, à minha casa. O “Serviço” é o que se vive lá de onde vim, “Serviço” é o que procuro fazer aqui. Nem sempre consigo, mas é o que procuro.
Castello Branco: Pelo que percebo das suas letras, e até mesmo do clipe “Calor do amor”, rola uma relação profunda com o Rio. É a sua maior influência?
Mahmundi: Amo o Rio. Morei por sete anos no Nordeste e senti muita falta daqui. Os meus EPs circulam dentro deste Rio que visualizo todos os dias e de que gosto de falar. “Setembro” trata deste meu último ano convivendo com pessoas novas, conhecendo gente. Fala do que vi nas pessoas e do que isso gerou em mim. Funciona como inspiração. No seu disco você diz “viver gera necessidade”, e, pra mim, este é um dos versos mais impactantes.
Mahmundi: Somos artistas novos, em movimento, temos muitas coisas pra fazer e perceber. Está preparado para suas necessidades?
Castello Branco: Estamos aqui pra aprender a lidar com nossas necessidades. Temos uns 70, 90 anos pra isso.
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