Mauro Telefunksoul Archive

sexta-feira

5

dezembro 2014

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Transcultura #153: Marfox, Cut Hands // The War On Drugs

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Texto de hoje da “Transcultura”, coluna que publico todas as sextas no jornal O Globo.

Batuques Sortidos
Festa do Novas Frequências hoje no La Paz traz inusitadas misturas de sons de Haiti, Angola, Portugal e Brasil, refletindo a proposta de apropriação de ritmos da quarta edição do festival
por Bruno Natal

Com 33 atrações de 11 países diferentes programadas para sua quarta edição, o festival Novas Frequências faz hoje uma festa no La Paz, na Lapa, com Cut Hands, DJ Marfox, Omulu x Maga Bo, Som Peba e Mauro Telefunksoul. Dentro das inúmeras possibilidades de se analisar a curadoria de um festival tão abrangente, um dos traços que unem os artistas da escalação é a apropriação de ritmos de outros continentes que não os seus para desenvolverem sonoridades próprias.

— O Cut Hands, que é escocês, injeta vodu do Haiti em uma mistura de techno e noise, enquanto o Marfox, de Portugal, pesquisa diversos ritmos africanos como a tarrachinha, a kizomba, o funaná e o kuduro — explica o curador e idealizador do festival, Chico Dub.

Apesar de nunca ter visitado o continente africano, Cut Hands acredita que essa distância e falta de experiência direta acaba incrementando sua criatividade, aguçando a imaginação. Além de Congo e Gana, o produtor também pesquisa bastante a percussão do Haiti.

— Ouvir percussões acústicas do Haiti mudou minha atitude em relação ao que era necessário para fazer uma música realmente intensa e alucinante. Até então era viciado em tecnologia para atingir isso, o que de repente descobri que não era necessário para chegar a um som tão potente.

As pesquisas levaram Cut Hands a conhecer mais sobre religiões afro-brasileiras como o candomblé, vindo também a fazer parte do seu som.

— Sou totalmente fascinado por essa música incrível. Algumas pessoas interpretam essa inspiração como uma apropriação, mas é apenas o meu estilo. Não desconstruo ou sampleio essas ritmos mágicos. É o espírito que me interessa ao evocar esses sons. Estou muito empolgado com a viagem ao Brasil e já estou tenso com a volta depois de uma estada tão curta — diz.

De Portugal e especializado no kuduro, estilo popularizado principalmente através do trabalho do Buraka Som Sistema, o DJ Marfox conhece bem a diferença entre os sons produzidos na terrinha e em Angola.

— A grande diferença está nas referências. Cresci ouvindo estilos musicais totalmente diferentes do que um produtor em Luanda ouviu. Por isso usamos samples que nos são mais familiares por termos ouvido anteriormente em outros estilos musicais que nos acompanharam desde que nos conhecemos como pessoas. Além disso, um produtor de kuduro em Luanda tem um milhão de MCs dispostos a cantarem em cima dos seus instrumentais, enquanto em Lisboa temos uma média de 10 ou 15 MCs. Por isso, 90% da música feita em Lisboa é instrumental, levando os produtores a construir algo mais compacto e sólido para a pista de dança.

Em Portugal, diz ele, acompanha-se muito o que é produzido culturalmente no Brasil. Em relação ao que é produzido pelos irmãos africanos, no entanto, o conhecimento ainda está se expandindo.

— A relação de Portugal com os países africanos que falam língua portuguesa está melhorando. Hoje temos a kizomba no topo das paradas em Portugal, algo que há cinco anos era impensável. A falta de oportunidade dada a um artista português vindo de um gueto de Lisboa faz com que me sinta um imigrante, mas, volto a dizer, as coisas estão mudando. Em Portugal nunca se ouviu tanta música portuguesa em todos os gêneros como agora — conta ele, que conhece funk carioca.

O carioca Omulu, que se também se apresenta na festa, quis saber se o DJ português deseja que a música de gueto se torne popular e, caso isso aconteça, o que virá do gueto então?

— O gueto continuará a se reinventar. O gueto sempre tem a sua forma de viver as coisas e não precisa da opinião do público em geral, imprensa, rádio ou TV para a música se tornar viral. Já o processo inverso é bem mais complicado — responde Marfox.

Tchequirau

Terceiro disco do The War on Drugs (banda fundada por Kurt Vile, hoje fora do grupo), “Lost In The Dream” chega ao final do ano firme como um dos melhores lançamentos do ano. Ouça quando der, mas é sempre legal ouvir no ano de lançamento.

quarta-feira

30

julho 2014

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sexta-feira

25

abril 2014

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Transcultura #135: Axé Bass // Coisas Que Eu Achava Quando Era Criança

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Versão integral e sem edição do texto de março da “Transcultura” (coluna que publico todas as sextas no jornal O Globo) e esqueci de republicar aqui:

A hora do axé bass
União de hip hop, dubstep, trap e outros ritmos eletrônicos começa a formar uma cena eletrônica em Salvador e arredores

por Bruno Natal

É o novo som de Salvador, é o novo som de Salvador. Mundialmente conhecido por seu carnaval, axé e também pela forte influência da cultura africana nas tradições locais, a Bahia tem adentrado também outro terreno fortemente relacionado a diáspora negra: a bass music.

Do reggae e dub ao hip hop, onde você escutar um grave pulsando e uma batida conduzindo o transe, pode ter certeza que África está ali. Portanto era de se esperar que o som eletrônico que carrega o grave no nome e que é a base do recente sucesso do dubstep e do trap encontrasse ecos em Salvador.

Formado por Mahal Pita, 26, e Rafa Dias, 24, o A.MA.SSA tem como objetivo conectar Salvador e a Bahia ao restante do mundo e o mundo a Salvador e a Bahia. “A música é uma das ferramentas”, dizem eles. Para eles o bass sempre esteve presente em Salvador, de uma forma ou de outra.

– Esse conceito bass, que de certa forma se aplica a um recorte recente, para nós foi sempre uma experiência bastante familiar. Ouvimos reverberar pela cidade essa sensação de potência, carros com paredões de som tocando pagodão, muitas vezes distorcido pela obsessão pelo grave, festas de largo com as tropas de percussionistas tocando nos surdos, de samba duro à samba reggae e, no topo da cadeia do poder sonoro, o carnaval, a cada ano maiores e mais potentes trios elétricos empurrando a massa – explica Mahal.

Grupos como A.MA.SSA, Som Peba, Bemba Trio, Mauro Telefunksoul, os DJs Hashta, Lucas Brasil, Kongo, Toshiro, Murilo Lobo e festas como Bass Down Low, Quintas Dancehall do Ministereo Público SoundSystem, as produzidas pelo Da A.Ma.ssa e pelo Coletivo Crokant, Sexxxta Bass (em Ilhéus), e Groove and Bass (em Vitória da Conquista). Recentemente parte dos artistas foram reunidos na coletânea “Bass Culture Bahia”, lançada pela governo do Estado, que serviu como catalisador da cena bass baiana e incluiu nomes já conhecidos como Baiana System e Lucas Santtana.

O DJ e produtor Mauro Telefunksoul, 37, parte dos coletivos Pragatecno, Crokant e do Naxapa Controle de Som, acredita que a “mandinga, percussão forte, suínge, calor humano e a musicalidade” do baiano são um fator diferencial no som produzido na boa terra.

– Cheguei a bass music através do Miami bass dos anos 90. Depois passei a tocar hip hop, digital hardcore, jungle, drum n bass, breakbeat, UK garage, grime até a a cultura do grave – conta Mauro, um dos pioneiros da música eletrônica na Bahia.

Para Mahal, uma revolução na concepção musical vem acontecendo em diversos guetos do planeta e em Salvador não é diferente.

– É música de periferia, baseada na tecnologia, ligada ao regional, mas sendo pensada mundialmente. Essas ressignificações não estão presentes apenas no contexto musical, estão em todo o entorno sociocultural. O pagodão atual possui em sua gênese a fusão de elementos da cultura urbana a sua própria referência de raiz: a chula, o samba duro, o lundu, o semba, o candomblé. Isso tornou sua rítmica inédita. Ao absorver influências contemporâneas, tornou-se um buraco negro, consumindo tudo que se põe ao seu alcance.

Pedro Marighella, 34, nome por trás do Som Peba e do OMÃ (esse com Thiago Felix), focado no pagodão e no arrocha, também enxerga um posicionamento político no som.

– Apesar da música de periferia ter a produção mais popular e instigante da Bahia, o estado ainda sofre muito com as diferenças sociais e o racismo. A parte da população que atua nessa produção não é diretamente atendida pelos benefícios que ela gera. Canibalizar essas referências é também uma ação política, um manifesto pela transformação necessária.
As referência estrangeiras pela qual são filtrados os sons locais seriam uma consequência inevitável.

– É muito difícil um jovem de Salvador não ter as influências do mundo nos dias de hoje. Nos anos 80, com a inclusão da região na cena global de world music, começamos a ouvir ainda mais música de diversas origens. No mesmo período a lambada, coupé decalé, zouk, pop africano influenciaram muito a música da Bahia. Influência estrangeira não são apenas músicas e bandas. Quando falamos em música eletrônica, o fato dos softwares não serem feitos no Brasil também conta, porque os bancos de samples, a linguagem empregada, os timbres dos synths deixam as sonoridades mais próximas. Começamos a ser musicalmente educados por tutoriais do Youtube – Pedro.

Ainda assim, não é fácil encontrar espaço para o som dessa bandas.

– Todo e qualquer som mais alternativo é complicado de se trabalhar por aqui. Apesar de Salvador ser a terra da música grave, como reggae e samba reggae, temos poucos lugares apropriados pra se ouvir um bom soundsystem, apenas trios elétricos nas ruas – diz Mauro.

Mahal aponta ainda o preconceito como fator dificultador.

– Ao mesmo tempo que temos um grande acervo, vasta matéria prima musical, carecemos de elementos extremamente básicos, de ordem estruturais e técnicas que acabam dificultando um progresso mais rápido e contundente. No caso específico da A.MA.SSA, que pertencemos ao universo do pagodão, ainda temos o agravante cultural e social, que é o preconceito e a resistência de quase todas as esferas da sociedade – Mahal.

Seu parceiro enxerga ainda outro empecilhos que impediriam até mesmo se falar em um cena local.

– Hoje não vejo uma cena, pois não há diálogo entre os produtores, as festas e o público, tudo é distinto – analisa Rafa.

Pedro rejeita a referência do “bass”.

– Me parece como a ironia pejorativa do “music” de “axé music”. Interessante é que o histórico do eletrônico na música pop baiana remonta ao axé mesmo. É frequente encontrar os nomes do argentino Ramiro Mussoto em créditos de disco dos 80 e 90 citado como “arranjo, samplers, programação MIDI e efeitos” ou simplesmente Carlinhos Brown tocando clap eletrônico na clássica “Fricote” de Luiz Caldas de 1985. Encontro meu “grave simbólico” nos três tipos de surdos dos blocos afro, mas estou numa boa com o “bass” cosmopolita. Amando-o e deixando-o.

Mahal é otimista na expansão do movimento grave que vem acontecendo.

– A Bahia vem assumindo cada vez mais o legado tropicalista de passear pelo mundo sem sair de casa. Já podemos observar o início dessas movimentações em outras cidades fora de Salvador. Mesmo que ainda bem tímido já é um sinal de amplitude.

Tchequirau

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“Eu achava que existia um ‘mundo das drogas’, e toda hora que a minha mãe dizia ‘ele se perdeu no mundo das drogas’, me perguntava por que as pessoas insistiam em continuar indo pra lá”. Esse é um exemplo dos depoimentos que você encontra no “Coisas Que Eu Achava Quando Era Criança”.